quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

É Natal

Narizes a pingar, camisolões de lã, luvas, gorros, mantas nos sofás, lareiras acesas, os Aliados iluminados - não há como enganar, já é Natal. Tempo de família e dos presentes, de bem-aventurança entre os homens. E de Cinema, de Cinema do bom e do melhor, como não poderia deixar de ser.

Pois bem, nós também temos os nossos presentes, de nós para os outros, de cá para o amigo leitor. E como o Natal é época de partilha, o que vai deste embrulho não poderia deixar de ser os nossos filmes de Natal que, por um motivo ou outro, por todos ou por nenhum, queremos (e gostamos) de partilhar. Filmes de Natal, que não conseguimos ver noutra altura do ano senão nesta. Leituras leves, esporádicas e episódicas, para ler antes, durante ou depois da consoada, sobre as obras que trazem à memória da redacção o cheiro a rabanadas e a aletria. Bom Natal!


GREMLINS, de Joe Dante (EUA, 1984)

A minha tradição natalícia sempre foi muito consistente, uma casa cheia de familiares, uma mesa de jantar recheada de guloseimas e a ânsia pelas prendas, escondidas no armário e debaixo da cama. No entanto, o mais esperado era as programações de Natal da TV, dias 24 e 25 repletos de filmes, das 3 da tarde até à meia-noite. Relembro agora Mousehunt, Home Alone e Problem Child, três filmes com lugares marcados no Natal, mas nenhum tão marcante como GREMLINS. Algo nos pequenos monstros parecia cativar a família toda, talvez o único filme que todos viam do inicio ao fim.

Uma história sobre responsabilidade e as repercussões que advêm de quebrar certas regras. Gremlins proporcionam momentos de diversão face às travessuras caóticas, numa época onde todos temos de ser bem comportados. O óptimo balanço entre comédia e terror torna impossível não simpatizar-mos com as pequenas bestas. Certamente o meu filme de natal predilecto, filme que irei revisitar amanhã acompanhado pela família e uma travessa de aletria.  

Wladimir Jr. Ribeiro


HOW THE GRINCH STOLE CHRISTMAS, de Ron Howard (Alemanha/EUA, 2000)

Chegada a época natalícia, é difícil esquecer um filme tão carregado de símbolos natalícios como HOW THE GRINCH STOLE CHRISTMAS, de Ron Howard, uma comédia de fantasia adaptada do livro de Dr. Seuss. Na terra de Whoville habitam os Whos que adoram o Natal, no entanto, fora da cidade vive o Grinch, uma criatura que o odeia e engendra vários planos para o roubar.

É difícil não sentir compaixão pelo vilão Grinch, certamente devido à qualidade da representação de Jim Carrey, que, ironicamente, acaba por roubar o filme também, transformando-o numa hilariante comédia para ver em família.

João Nuno Pratinha


IT'S A WONDERFUL LIFE, de Frank Capra (EUA, 1946)

Chega o Natal e pareço logo um disco-riscado: mas qual Home Alone, qual quê, é preciso é ver o IT'S A WONDERFUL LIFE! E é preciso vê-lo urgentemente, não vá a quadra esfumar-se sem que haja a oportunidade de o (re)encontrar, fazendo-nos esperar pelo próximo ano. Que isto de ver filmes de Natal fora de época não tem jeitinho nenhum - e para os restantes onze meses haverá outros tantos Capras, cada qual mais belo do que o anterior, mas nenhum tão belo quanto este. A estória já todos a conhecem de cor, mas vale a pena recordar (e resumir): George Bailey (o incontornável James Stewart) é um homem tão bom, mas tão bom, que todos fazem dele gato-sapato, principalmente o diabólico Mr. Potter de Lionel Barrymore. Até que, ao perder o seu dinheiro, se decide mandar de uma ponte e conhece Clarence, um anjo de segunda, que lhe recorda tudo o que há de bom na vida (e tudo o que haveria de pior, não fossem homens como ele).

George/Jimmy é - e os protagonistas de Capra são-o todos à sua maneira - o melhor dos homens, profundamente marcado pelo Humanismo do italo-americano. Sacrificando tudo o que é seu pelos amigos (e não seremos todos amigos de George?), é quando se prepara para sacrificar o que de último tem, a vida, que se apercebe que o sacrifício não tira apenas, também dá - e já cantava Johnny Cash «The wealthiest person is a pauper at times, compared to the man with a satisfied mind». É esse o presente maior de It's a Wonderful Life, panaceia para todas as dores do ano, todo o Cinema desse grande senhor, docemente embrulhado, e muito bem embrulhado, por sinos, anjos e, sobretudo, gente que nos ama como só Capra nos foi capaz de amar. «Remember, George: no man is a failure who has friends» - é uma vida maravilhosa, lá isso é.

António Tavares de Figueiredo

domingo, 14 de dezembro de 2014

Sunday Stills #56: "Les amours imaginaires"


Na semana de estreia em sala do mais recente filme de Xavier Dolan, recordamos o seu LES AMOURS IMAGINAIRES. Rapaz e rapariga, rapaz e rapaz, triângulos, rectas, círculos, o real e o imaginário.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Godzilla, a Lenda II

Godzilla vs Zilla

GODZILLA, de Robert Emmerich, foi a primeira reimaginação do original de 1954 para o público internacional. Com um monstro maior, mais amistoso e geralmente menos ameaçador. Tão distante do seu predecessor que também é apresentado em GODZILLA: FINAL WARS, como Zilla, "o monstro que os americanos achavam ser Godzilla".


Podia reflectir bastante sobre as mudanças abruptas que esta personagem sofre nas suas longas-metragens, como a sua personalidade e o próprio aspecto físico sofrem alterações constantes. Mas não vale a pena, a única mudança digna de nota é a do Godzilla de Emmerich, um filme que falha em muitos aspectos, seja o argumento imbecil ou as personagens irritantes. No entanto, a adaptação de 1998 incomoda-me, em primeiro lugar, com o design pouco imaginativo do monstro. A influência de Jurrassic Park (1993) é mais que clara, até somos presenteados com grupo maior, mais hilariante de velociraptors, Godzilla é reduzido uma lagartixa gigante (T-Rex?), tão ameaçadora como uma iguana domestica. Antes uma personagem orgulhosa, agora um simples animal selvagem que só chateia por ser grande.

Godzilla pode ter alterado a identidade do rei dos monstros, mas dificilmente será esse o único motivo do fracasso que é o filme. O argumento é medonho, ninguém parece saber o que está a fazer, as personagens têm demasiados momentos de completa morte cerebral, e Jean Reno no papel de francês condescendente, magnifico. Emmerich faz um trabalho menos que medíocre, já pouco espero dele, mas ainda assim me desilude, sequências tão incoerentes e noções absurdas de espaço não me permitem desfrutar deste filme. Não se trata de ser ou não um filme do Godzilla, obviamente não é, trata-se, sim, de uma fraca tentativa a um filme cómico e trágico, que não é cómico nem trágico. Apenas um autêntico aborrecimento.

Um Último Confronto

Felizmente, o Zilla não durou muito e uns anos mais tarde Godzilla surge por uma última vez, para afirmar a sua posição dominante como Rei dos Monstros. Num guerra em grande escala com os seus maiores inimigos, Godzilla: Final Wars, de Ryûhei Kitamura, relembra-nos do que realmente resplandece nos filmes do seu franchise, puro divertimento. Antes do novo reboot da Legendary Pictures tomar as rédeas, Final Wars promete diversão caótica e disparatada, sem preocupações.


As suas raízes de destruição insensata já foram abandonadas à muito, Godzilla luta para proteger o mundo, a qualquer custo. Desta vez, contra extraterrestres que o querem conquistar, e os seus monstros de estimação. Juntamente com a Earth Defence Force, nenhuma cidade está a salvo da destruição que se avizinha. Derrotando um a um, à volta do planeta, Godzilla é rápido e determinado, até ter de enfrentar o mais forte dos seus adversários, Monstro X. - Entretenimento garantido à custa de integridade. Mas devíamos ter de nos preocupar com tais trivialidades? Tendo em conta o que já sabemos que vamos ver. Acredito que não.

Talvez a adaptação de 1998 perca ainda mais pela falta de consciência dos seus objectivos. Enquanto Final Wars ganha, na medida em que é objectivo nas suas intenções e não promete para lá disso. Penso que, quando todo o franchise foi direccionado para o público mais novo, tornou-se mais complicado revertê-lo às suas origens mais maturas e Godzilla (1998) sofreu por isso. Aí Final Wars lembra, antes de mais, os disparatados cartoons e anime, com o que realmente gostávamos de ver quando éramos mais novos. Um exercício em nostalgia - a melhor maneira que tenho para o descrever - que rapidamente se engrena com as vinte e muitas memórias anteriores.


Título Original: Godzilla (EUA/Japão, 1998)
Realizador: Roland Emmerich
Argumento: Dean Devlin, Roland Emmerich
Intérpretes: Matthew Broderick, Jean Reno, Maria Pitillo, Hank Azaria, Kevin Dunn, Michael Lerner
Música: David Arnold, Michael Lloyd
Fotografia: Ueli Steiger
Género: Acção, Ficção Científica, Thriller
Duração: 139 minutos


 

Título Original: Gojira: Fainaru uôzu (Japão/Austrália/China, 2004)
Realizador: Ryûhei Kitamura
Argumento: Isao Kiriyama, Ryûhei Kitamura, Wataru Mimura, Shogo Tomiyama
Intérpretes: Masahiro Matsuoka, Rei Kikukawa, Don Frye, Maki Mizuno, Kazuki Kitamura, Kane Kosugi
Música: Keith Emerson, Nobuhiko Morino, Daisuke Yano
Fotografia: Takumi Furuya
Género: Acção, Aventura, Ficção Científica
Duração: 125 minutos


quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Godzilla, a Lenda I

Com cerca de 60 anos de existência, mais de 40 horas no grande ecrã e um total de 29 filmes, Godzilla tornou-se num ícone gigantesco da cultura japonesa. Inicialmente retratado como uma ameaça, subsequentemente alternando entre os papeis de herói e anti-herói, Godzilla sofreu grandes mudanças ao longo do tempo, salvando e destruindo a Humanidade como bem lhe aprouver. 


Um monstro, produto da arrogância do Homem e um símbolo alegórico referente ao uso de armas nucleares, instável, massivo e altamente destrutivo. Godzilla oferece momentos de bom entretenimento, algumas confusões disparatadas e destruição em grande escala. Para lhe fazer uma pequena homenagem vou então falar um pouco sobre este símbolo e o seu trajecto, a sua história, num formato que parece agradar todos hoje em dia, uma trilogia.

O Inicio 

«Now i am become death, the destroyer of worlds»

- Bhagavad-Gita

GOJIRA, de Ishiro Honda, juntamente com King Kong (1933), são os pioneiros dos filmes de monstros gigantes, verdadeiras obras do cinema cujo sucesso ainda é explorado. Dando vida ao monstro mais reconhecido mundialmente, Gojira é o começo de uma longa lista de filmes, séries de TV, jogos, brinquedos, roupa e, basicamente, tudo onde se possa colocar Godzilla. O Rei dos Monstros provou-se contra tudo e todos, e parece que nem o tempo é obstáculo para impedir, ou até mesmo debilitar, o seu poder.

A premissa é bastante simples. O uso de armamento nuclear enfurece e fortalece uma antiga criatura, conhecida como Godzilla. Este ataca incessantemente a população de Tokyo, apesar dos esforços para o impedir. Sem nenhuma fraqueza aparente, Godzilla possui um poder catastrófico e sacrifícios terão de ser feitos para salvar a humanidade. 

A maior questão será - o que faz este filme ser tão bom? O seu entre-linhas que espelha o trauma do povo japonês pós-2º Guerra Mundial, causado pelos americanos. Ou a sua qualidade como um filme, como sendo interessante, com uma execução bastante boa e capaz de entreter? Embora o seu ritmo seja inconsistente, ocasionalmente lento demais, seria fácil achar que talvez a mensagem inerente fosse a razão, mas a verdade é que não temos que analisar tão fundo para realmente apreciar este filme.

Acredito que Gojira vale, em primeiro lugar, pela sua qualidade como filme, algo que se perde nas restantes sequelas. Pode não ser o melhor filme, mas funciona como um bom filme de terror/sci-fi e entretém do início ao fim, com um uso inteligente e eficaz de efeitos visuais, numa época onde ainda não éramos abençoados com a magia do CGI. Aí é onde este filme se destaca com a sua própria magia.


Título Original: Godzilla (Japão, 1954)
Realizador: Ishirô Honda
Argumento: Takeo Murata, Ishirô Honda, Shigeru Kayama
Intérpretes: Akira Takarada, Momoko Kôchi, Akihiko Hirata, Takashi Shimura, Fuyuki Murakami
Música: Akira Ifukube
Fotografia: Masao Tamai
Género: Terror, Ficção-Científica, 
Duração: 98 minutos
 

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Fui ao Porto/Post/Doc revisitar fantasmas

Aproveitei o feriado para fazer o que costumo fazer nos dias úteis: meter-me numa sala a ver filmes. Mas, calma lá, que não foram uns filmes quaisquer, nem numa sala qualquer. Aproveitei o feriado para me enfiar no Rivoli, que acolhe por estes dias o Porto/Post/Doc, o novo festival da cidade, a ver documentários. A ocasião, de resto, pareceu-me propícia: desde logo, porque o tempo não dá tempo, que é como quem diz, há que aproveitar os momentos de ócio que o calendário nos oferece para frequentar eventos destes; depois, porque há qualquer coisa na expressão "Imaculada Conceição" que me lembra Manuel Mozos e João Bénard da Costa, o prato forte do dia.

Aproveitei também a ocasião - esta rebarbada e episódica cobertura ao festival, longe da prisão dos passes de imprensa - para revisitar fantasmas de outros tempos. Das sessões no Pequeno Auditório do Rivoli, dos corredores e cadeiras que já me acolheram mil sonhos, do cheiro do foyer onde travei outras tantas amizades. Contas de outros rosário (festival?), portanto.

Voltemos, no entanto, ao Porto/Post/Doc, que é uma maneira bem mais simpática de dizer "ao que interessa". E que aqui o que nos interessa - e se interessa! - são os filmes. Até 13 de Dezembro, o Rivoli (bem como o Maus Hábitos e o Passos Manuel) recebe esta bela iniciativa, ainda com aroma a novidade, com base (quase) exclusivamente documental, e que dobra como o evento mais interessante a decorrer na cidade pelos dias que correm - a malta da patinagem no gelo aqui ao lado que me perdoe a sinceridade. Vamos lá, então.


WAITING FOR AUGUST, de Teodora Ana Mihai (Bélgica/Roménia, 2014):

Os anglo-saxónicos têm uma palavra, simultâneamente bela e desoladora, que descreve na perfeição o primeiro plano de WAITING FOR AUGUST, de Teodora Ana Mihai: bleak. Não duvido que haja na nossa língua um sinónimo oportuno, mas aquelas cinco letras enquadram-se naquela estrada destingida pela neve e pelo asfalto, ocasionalmente pontuada pelos amarelos das luzes e pelos vermelhos dos sinais. Após esse intróito, pouca esperança se afigura para o que sobra do filme.

Todos os anos, milhares de pais romenos abandonam o país em busca de trabalho, deixando os filhos para trás. Atenção: abandonam o país, não os filhos, que esses não se podem abandonar. Pelo menos, é isso que Mihai nos quer mostrar. Na verdade, sabemos que há pais que abandonam os filhos; mas sabemos, igualmente, que esta mãe não abandonou os seus. A prova está no título, basta esperar por Agosto para que regresse. Mas se esperamos pelo regresso em Agosto, esperamos também pela nova partida no final do mês, pela repetição do ciclo anual. É essa uma das verdades inexoráveis de Waiting for August: qualquer retorno é temporário.

Daí que as crianças de Liliana sejam deixadas durante o ano ao cuidado da irmã mais velha, que só tem quinze anos. A uma espécie de parenting by proxy - quer da irmã-mãe, quer da televisão, que insiste em passar telenovelas espanholas - numa casa governada por quem ainda não tem (ou não devia ter) idade para a governar. E se, a espaços, nos podemos facilmente esquecer que Georgiana é. também ela, uma criança, cedo nos recordamos que sofre dos mesmos dramas que os nossos teens, das mesmas angústias próprias da idade. E é essa a outra verdade inexorável de Waiting for August, a de que, para os irmãos terem infância, Georgiana teve de hipotecar a sua.

Assim, e de verdade em verdade, de verdade para verdade, a obra de Mihai consegue o que poucas outras conseguem: um retrato da vida de uma família através de uma intromissão em grande parte invisível (e alguém reparava, à saída do filme, que quando as pessoas quebravam a tela não era para olhar para as câmaras, era para olhar para as pessoas por detrás delas). O bleak transformado em algo belo, como só o Cinema é capaz de transformar.


JOÃO BÉNARD DA COSTA - OUTROS AMARÃO AS COISAS COISAS QUE EU AMEI, de Manuel Mozos (Portugal, 2014):

Sala composta, compostíssma, para JOÃO BÉNARD DA COSTA - OUTROS AMARÃO AS COISAS QUE EU AMEI. Tão cheia, que me vi no meio de um cortejo fúnebre (ou assim julgava, antes da sessão) escadaria abaixo. Por dois motivos - que, afinal, seriam só um -: 1) a oportunidade rara de "apanhar" um Mozos em sala; e 2) a vontade de (re)ver Bénard da Costa, uma espécie de paizinho (e "paizinho", aqui, no sentido mais carinhoso possível) cinéfilo.

Outros amarão as Coisas que eu amei é um filme imenso, tão imenso que quase não cabe na tela. Tão imenso, que precisa de se socorrer de outros filmes, igualmente imensos, para que possa existir. Do mais belo Lubitsch, do mais completo Ray, do mais musical Minnelli, do mais poético Dreyer, dos excertos de Oliveira e Ruiz. E através dessas Coisas todas, que, no fundo, são apenas uma, o Amor de Bénard da Costa - e de Mozos - contagia quem o ouve. E infecta o íntimo, como um vírus que se alastra, sem cura nem salvação. Porque o Cinema só existe em quem o sente, em quem sobre ele fala, em quem sobre ele escreve.

E Ray, Lubitsch e Mankiewicz, mesmo depois de levados pelo Tempo, pelo «homem da ampulheta». continuam, entre nós, tão presentes como quando, em carne, o estavam. E, como nessa luminosa cena de Gigi, é a memória que os faz, e que faz deles deuses, que os perpetua além-túmulo. A letra mata, o espírito vivifica - e não será o celulóide, também, ele letra, e o espectador espírito?

Do milagre da memória, de que já falava Luís Costa no seu Fontelonga, poucos saberão tanto como Bénard da Costa, o homem que viu Johnny Guitar mais de sessenta vezes (sessenta e oito antes do final dos anos oitenta, se a memória não me falha), mas que sobre ele só conseguia falar «delirando». E é, outrossim, sobre a memória que outros dos filmes seleccionados, The Ghost and Mrs. Muir, versa, nesse solilóquio do Capitão Daniel Gregg reproduzido, que, como diria Régio, «é um vendaval que se soltou,/ É uma onda que se alevantou,/ É um átomo a mais que se animou...». Aliás. é sobre a memória, sobre o acto de rememorar, que Mozos constrói o seu Bénard da Costa, a sua carta de amor ao Homem que tudo nos deu sem nunca nos exigir nada em troca, nada senão o desejo de viver com ele o que ele vivia tão profundamente.

Acredite, amigo leitor, que tentei evitar ao máximo o patetismo do que aqui derramo. Tentei, mas tentei em vão. Porque o Cinema não vive só, nem sobretudo, do objectivo, do que está lá e do que deixa de estar, mas também do subjectivo, do que dele levamos quando abandonamos a penumbra e os fantasmas. E se arrisco o absolutismo de afirmar Outros amarão as Coisas que eu amei - e nenhum outro filme foi capaz de me fazer deixar a sala tão contente, tão desfeito, tão abalado nas minhas convicções, tão sem saber o que fazer - como sendo o mais belo filme de sempre, faço-o porque acredito que o seu objecto é, por sua vez, também ele o mais belo. Bénard da Costa, João, quis que outros amassem o que ele amou. Hoje, digo com toda a certeza que amamos. Talvez não o amemos tão intensamente, com tanta disponibilidade. Mas amamos. E isso já ninguém nos tira. Nem o Tempo...

«Quem não percebe, não percebe também a dimensão do que não percebe.»

[JOÃO BÉNARD DA COSTA - OUTROS AMARÃO AS COISAS QUE EU AMEI repete esta quinta-feira, 11 de Dezembro, no Pequeno Auditório do Rivoli, às 18h00.]

António Tavares de Figueiredo

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Filme do Mês #7

Todos os meses, o filme com estreia - comercial - nacional que melhor pontuação recebeu da redacção do Matinée Portuense, e o que por cá se escreveu sobre ele.

Novembro, 2014

Depois do longo intervalo, voltamos a escolher como Filme do Mês uma obra de Richard Linklater. Desta feita, é BOYHOOD a merecer a distinção. A crítica - e as nove câmaras vermelhas - pertence a Tiago Rocha.
 

«Richard Linklater ousa deliciar-nos com 12 anos de vivências sem flashbacks, grandes adornos ou efeitos especiais. Uma década (e mais uns trocos) do progresso das personagens, não só enquanto elementos figurativos extrapolados da criatividade de uma mente brilhante (que é a de Linklater), mas também das personagens enquanto actores, representações reais do mundo objectivo.» (TR)

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Trailer de "Star Wars: The Force Awakens"

Star Wars regressa em 2015 e finalmente temos as primeiras imagens do que nos espera. Sendo um marco na infância de muitos de nós, as expectativas estão em alta e o pequeno vislumbre da nova Millenium Falcon só melhora toda a situação. STAR WARS: THE FORCE AWAKENS, realizado por J.J. Abrams, será uma das grandes estreias do próximo ano e este primeiro teaser parece promissor.