domingo, 31 de março de 2013

Porto Surf Film Festival, Dia 1


Começou dia 30, o Porto Surf Film Festival, e a redacção teve o prazer de marcar presença nesta sua primeira edição. Este pequeno festival traz-nos uma diversificada compilação de filmes e documentários sobre o surf, um tema que pode parecer, inicialmente, focado num certo público alvo mas poderá surpreender muitos que arrisquem comparecer.

Neste primeiro dia foram exibidos ONE WINTER STORY, de Sall Lundberg e Elizabeth Pepin, e THE ENDLESS SUMMER II, de Bruce Brown. Acredito que as primeiras exibições foram um bom presságio para o que estava para vir nos próximos dias.

ONE WINTER STORY, de Sall Lundberg e Elizabeth Pepin (EUA, 2006)

A história de Sarah Gerhardt e tudo o que levou à sua conquista de uma das maiores ondas do mundo, a onda de Mavericks. Este documentário biográfico da primeira mulher a surfar uma onda desta magnitude acaba por se tornar em algo bastante sentimental e inspirador, não só pelo desafio como pelas diversas dificuldades que teve que ultrapassar ao longo da vida e que levaram aos seus grandes feitos, sejam eles académicos ou no desporto.

O que torna mais dificil a sua visualização será o excesso de granulado nas imagens, uma escolha talvez pouco pensada, visto que muitas dessas imagens seriam bastante deslumbrantes sem esse aspecto. No entanto, é um filme bem construído, com um desenvolvimento apropriado para o tempo de filme que tem. (WJR)

THE ENDLESS SUMMER II, de Bruce Brown (EUA, 1994)
.
Bruce Brown volta quase 30 anos depois com a sequela de um dos seus grandes trabalhos. Este traz-nos uma hora e meia de imagens simplesmente magnificas, a ocasional piadinha, um pouco de cultura e muito surf.

Aqui seguimos a viagem à volta do globo de dois fanáticos do surf pelos melhores locais para se praticar o desporto. Embora pelo caminho as desventuras sejam muitas, o destino é alcançado e são acompanhados por diversas caras familiares do primeiro filme. As duas personagens pouco importam para o cenário, a única coisa a saber é que um é o completo oposto do outro e passam o Verão a surfar nos sítios mais fantásticos.

O filme garante a qualquer público um tempo bem passado, sempre com um sorriso na boca, e nunca cansa referir que as imagens em altura de surf são espectaculares, definitivamente uma grande melhoria do primeiro em muitos aspectos. (WJR)

Sunday Stills #31: "The Ten Commandments"



Charlton Heston como Moisés em THE TEN COMMANDMENTS, de Cecil B. DeMille. O épico de quase quatro horas - verdadeiro portento técnico - é um dos filmes mais adequados para a Páscoa.

sábado, 30 de março de 2013

Quando as marcas se sabem vender #4

A dupla Wes Anderson-Roman Coppola continua a provar-se uma das mais criativas do momento. Depois de filmes como THE DARJEELING LIMITEDMOONRISE KINGDOM - e com o próximo, THE GRAND BUDAPEST HOTEL, anunciado para o próximo ano -, viraram-se desta feita para a publicidade. O anúncio realizado para a Prada - com o sempre idiossincrático estilo de Anderson - é verdadeiramente delicioso.


sexta-feira, 29 de março de 2013

The Day I Will Never Forget (2002)

Permita-me o leitor começar a resenha com um aviso. De amigo, está claro. THE DAY I WILL NEVER FORGET será, muito provavelmente, um dos filmes mais crus e brutais alguma vez filmado. Em particular uma cena a meio, das mais controversas do Cinema, que envolve a circuncisão semi-explícita de duas meninas. É, contudo, também uma obra de elevadíssimo valor, urgente de ser descoberta, vista e analisada. Não será - à semelhança dos restantes trabalhos de Kim Longinotto, sempre atenta na sua observação do Mundo -, portanto, algo para se tomar de ânimo leve.

Aviso feito, hora de ir ao que realmente interessa. No Quénia, milhares de raparigas são vítimas da circuncisão forçada do clitóris. Há quem lhe chame mutilação genital - e com toda a razão, acrescente-se -, mas Kim Longinotto prefere o primeiro termo durante o documentário. Através de trechos captados em diferentes situações - consultas médicas, uma tertúlia de mulheres que discute o assunto, uma audiência em tribunal e até mesmo dos próprios rituais -, a britânica vai expondo os diferentes lados da questão. De um lado, os que são a favor da tradição - e já Vera, de Sisters in Law, outros dos grandes filmes de Longinotto, dizia «My whole life has been spent fighting tradition» -, do outros, os que a ela se opõe através do ponto de vista dos direitos.

Mas se para o espectador ocidental, à distância e, à partida, sem qualquer envolvimento extraordinário, o problema seria facilmente solucionado, com os partidos a serem tomados rapidamente, nas sociedades patriarcais do Quénia e da Somália - mas em que as matriarcas não estarão, igualmente, isentas de responsabilidade - o tema dá pano para mangas. Pelo meio, há a já mencionada cena da circuncisão - coisa violentíssima, desaconselhável para gente impressionável -, auge da visceralidade - será? - na obra de Longinotto. Segue-se-lhe outro plano de semelhante força - e que, confesso, me custou ainda mais ver -, o de uma menina que declama um poema sobre a sua circuncisão. Esses quinze minutos de filme desarmam completamente o espectador; é impossível ficar-lhes indiferente.

Tradição versus razão. No final, as raparigas que não querem ser mutiladas ganham em tribunal. Com a Lei do seu lado, os pais já não as podem obrigar ao ritual. Algumas voltam para casa, outras preferem ficar longe. Quanto a mim, arrisco-me a avançar que The Day I Will Never Forget, pela sinceridade brutal a que Kim Longinotto nunca se escusa, terá sido um dos filmes que mais me custou ver. Absolutamente obrigatório.

-//-

THE DAY I WILL NEVER FORGET será exibido hoje, dia 29 de Março, às 17h00, no Cinema Passos Manuel, no Porto. A sessão está inserida na retrospectiva dedicada a Kim Longinotto, que se prolongará até dia 30 de Março no Porto - com a presença da realizadora -, e migrará para Lisboa de 4 a 7 de Abril. Oportunidade única para assistir em sala a algumas das obras mais interessantes daquela que é uma das documentaristas mais proeminentes da actualidade.

quinta-feira, 28 de março de 2013

Trailer de "The Wolverine"

O novo filme de Wolverine - personagem da Marvel - já tem trailer. THE WOLVERINE, dirigido por James Mangold e protagonizado por Hugh Jackman, chega às salas nacionais dia 25 de Julho.


quarta-feira, 27 de março de 2013

A Última Vez Que Vi Macau (2012)

Nunca fui a Macau.

O filme começa e surge logo, quase a matar, Cindy Scrash - a Irene de Morrer Como Um Homem - a cantar You Kill Me para a câmara. A câmara, leia-se, o público. Andam uns tigres pelo fundo, enjaulados, e percebe-se que a cena tem qualquer coisa de cabaret. Uns planos depois, um jogo de paintball - uma guerra fictícia -, em que um dos participantes acaba morto. E põe-se Guerra da Mata a caminho de Macau, sem perceber muito bem o porquê da coisa. Agora pergunta o caro leitor que esquisitice em forma de filme será esta. E pergunta muito bem, que o caso não é para menos. Trata-se, afinal, de A ÚLTIMA VEZ QUE VI MACAU, de João Pedro Rodrigues e João Rui Guerra da Mata, fita fabulosa e incrivelmente singular na sua construção.


Continuando onde ficamos, mete-se Guerra da Mata em Macau, a pedido de Cindy - que aqui é Candy, a piscar o olho à do Andy Warhol -, que teme pela sua vida. A moça envolveu-se com os homens errados e viu-se numa alhada. E não é que Guerra da Mata é o único em quem ela confia para a salvar? O gostinho a film noir - o whiskey, as sombras, a própria donzela em apuros - que fica desses momentos iniciais permanecerá durante o resto do filme. Esta Macau - a que Guerra da Mata ao princípio não reconhece e que Rodrigues nunca visitara antes - é, na sua essência, um cemitério de filmes e estrelas, uma terra com o espírito intimamente ligado ao Cinema. Não se estranhem, por isso, as meias de Jane Russell - que morreu enquanto se filmava A Última Vez Que Vi Macau - a flutuar à entrada da gruta dos piratas, ou a música - retirada de Macao, de Josef von Sternberg - com que Candy abre a estória.

É também através dessas referências cinematográficas, sempre criteriosas - não fosse João Pedro Rodrigues o realizador que disse, numa entrevista, não gostar de filmes de citações -, que se desmonta a obsessão de conhecer a cara aos protagonistas. Não chega a haver uma materialização, no sentido convencional, do sujeito: vêem-se mãos e pés, ouvem-se vozes incorpóreas que narram, reflectem, planeiam e explicam. Da mesma forma, não se assiste às mortes das personagens, nem às suas metamorfoses. Essa ideia de construir uma casa com paredes e telhado - as convenções, os cânones do(s) género(s) -, mas não lhe dar recheio - as caras, as mortes - será, porventura, o mais desconcertante para o espectador em A Última Vez Que Vi Macau. Porque se quem vê caras não vê corações, quem não as vê tem, normalmente, ainda mais dificuldade em os perceber.

O documentário que não o é - mas que poderia tê-lo sido, olhando para a curta Alvorada Vermelha - e o noir sem enchimento: João Pedro Rodrigues e João Rui Guerra da Mata manejam habilmente as regras e expectativas, filmando uma terra que, existindo, não passa de uma ilusão. E que, exactamente por ser uma miragem - com os néons, os casinos, os fogos-de-artificio, o exotismo de uma figura que dá pelo nome de Madame Lobo e as gaiolas douradas -, custa ainda mais a abandonar. O que se consegue em A Última Vez Que Vi Macau, com os seus mistérios por desvendar e caminhos por percorrer, é realmente algo de único.

Nunca fui a Macau. Minto, já lá estive. E gostei imenso do que vi.


Título original: A Última Vez Que Vi Macau (França/Macau/Portugal, 2012)
Realizador: João Pedro Rodrigues, João Rui Guerra da Mata
Argumento: João Pedro Rodrigues, João Rui Guerra da Mata
Intérpretes: João Rui Guerra da Mata, Cindy Scrash, João Pedro Rodrigues
Género: Crime, Documentário, Drama, Fantasia, Mistério
Duração: 85 minutos




terça-feira, 26 de março de 2013

Trailer de "Spring Breakers"

SPRING BREAKERS, de Harmony Korine, arrisca-se a ser um daqueles filmes sui generis - sobretudo, após o polémico monólogo de James Franco - que ninguém sabe lá muito bem onde encaixar. Enquanto não chega a Portugal, vale a pena ir tentando percebê-lo pelo trailer. Não garantimos é que haja sucesso na tarefa.


segunda-feira, 25 de março de 2013

Conversa de travesseiro #2

Depois de já por cá termos falado de LE QUAI DES BRUMES, de Marcel Carné, a propósito daquela memorável cena na cama que na altura - anos 30 - se assumiu como uma representação pioneira da sexualidade no Cinema, reservamos agora o momento para CASQUE D'OR, de Jacques Becker.

Quase duas décadas depois de Carné, Becker faz da cama de uma pensão - será uma pensão? - peça central de um filme. Explique-se a cena, para quem não a conhece: Manda, criminoso reabilitado mas obrigado a assassinar um rival durante uma rixa, foge de Paris para não ser preso. Marie, antiga acompanhante do defunto e interesse amoroso de Manda, atrai-o a uma casa no campo, onde o espera. Manda descansa num prado junto ao rio, desconhecendo quem lhe pediu para se deslocar ao local, até que Marie lhe surge, acordando-o. Fade para preto. Manda e Marie aparecem juntos na cama.

Perdoe-nos o leitor o estranho campo-contra-campo acima ensaiado, mas uma sequência destas merece a devida atenção. Confirme-se, pois, Jacques Becker como um dos grandes nomes do Cinema clássico.






CASQUE D'OR (1952), de Jacques Becker

domingo, 24 de março de 2013

Bullet to the Head (2012)

Juntar o pior dos buddy films com o que sobrou de Sylvester Stallone - que, em abono da verdade, também não abundará em qualidade - nunca poderia produzir um bom resultado. E, sem qualquer argumento, BULLET TO THE HEAD, de Walter Hill, prova a teoria. Mas mais interessante do que analisar o filme - até porque não há muito por onde lhe pegar -, será, porventura, compará-lo com o último de Arnold Schwarzenegger.

Escreva-se, antes de mais, que Sly ainda se encontra numa forma física invejável - bem melhor do que a actual de Schwarzenegger -, especialmente se tivermos em conta os seus 66 anos. E é exactamente essa boa condição física que ajuda a que as cenas de luta de Bullet to the Head convençam mais do que as de The Last Stand. Fora isso, e admitindo que ambos os filmes evocam memórias do cinema de acção dos anos 80, o filme de Stallone perde em todos os departamentos - com a montagem, das piores de que tenho memória, à cabeça - para o do austríaco.

O que faz com que Bullet to the Head seja, manifestamente, muito mais fraco como filme. De Stallone já nem digo nada - nem tão pouco estranho a empresa -, mas julgava que Walter Hill tivesse juízo de sobra para não se meter em coisas destas. Parece que, afinal, me enganei.


Título original: Bullet to the Head (EUA, 2012)
Realizador: Walter Hill
Argumento: Alessandro Camon (baseado na novela gráfica de Alexis Nolent)
Intérpretes: Sylvester Stallone, Sung Kang, Sarah Shahi, Adewale Akinnuoye-Agbaje, Jason Momoa, Christian Slater, Jon Seda, Holt McCallany
Música: Steve Mazzaro
Fotografia: Lloyd Ahern II
Género: Acção, Crime, Thriller
Duração: 92 minutos


Sunday Stills #30: "Sisters in Law"



Em vésperas da retrospectiva dedicada a Kim Longinotto, o fotograma da semana é retirado de SISTERS IN LAW, um dos mais interessantes documentários da realizadora britânica, dirigido a meias com Florence Ayisi.

Sisters in Law será exibido na próxima sexta-feira, dia 29 de Maio, no Cinema Passos Manuel, no Porto, às 19h00, e dia 5 de Abril no Cinema City Classic Alvalade, em Lisboa, às 21h30.

"Carrie" em espanhol e modo-vampiro?

Já tem dois anos, mas ao recordá-lo recentemente reparei nalguns paralelos entre o teledisco da música La Chica Vampira, dos Papa Topo - cujos videoclipes são sempre, aliás, pequenos tesourinhos -, e CARRIE, de Brian De Palma. Estarei certo, ou será que fui mordido pela pop-punk estival da canção?


sábado, 23 de março de 2013

Trailer de "Trance"

Danny Boyle é um realizador de extremos. Capaz do muito bom e do simplesmente sofrível - às vezes até dentro da mesma obra -, os seus filmes são sempre alvo de certa antecipação. O mais recente, TRANCE, já conta com trailer. A fita chega a Portugal dia 25 de Abril.


sexta-feira, 22 de março de 2013

Poster oficial de Cannes 2013

Um dos grandes festivais de Cinema - quer a nível europeu, quer mundial -, Cannes tem seguido a tendência de homenagear nos posteres das suas edições mais recentes as estrelas do passado. O deste ano não é excepção: Paul Newman e Joanne Woodward, numa imagem retirada de A NEW KIND OF LOVE, de Melville Shavelson, surgem no cartaz oficial desta edição do festival francês. Belo ponto de partida.


A 66ª edição do Festival de Cannes decorrerá entre 15 e 26 de Maio.

quinta-feira, 21 de março de 2013

Night Train to Lisbon (2013)

Parece-me que NIGHT TRAIN TO LISBON nunca será um filme consensual. Onde muitos verão monotonia, outros tantos descobrirão belos momentos de Cinema - e escreva-se logo a abrir que a fotografia é deslumbrante - plenos de significado. Aliás, o próprio filme, girando em torno de coincidências e da Filosofia - os protagonistas são um professor da disciplina e um médico dado a reflexões existenciais -, permite essa dualidade de opiniões.


Um homem salva uma rapariga que se quer matar. Ela foge, deixando-lhe um casaco vermelho - cor importantíssima durante o filme - e um livro em português. O homem, impressionado pelo que lê, e descobrindo um bilhete de comboio no interior do livro, parte imediatamente rumo a Lisboa. Quer conhecer o autor da obra, mas ele já morreu. Dedica-se, pois, a desvendar o mistério da sua vida.

Night Train to Lisbon faz-se entre o road movie e o filme de mistério - não chegando, no entanto, a pertencer inteiramente a nenhum dos géneros -, um exercício de calma na maneira como Bille August filma o passado, mas, sobretudo, o presente. Capaz de, mais uma vez, aliciar um elenco internacional de qualidade comprovada - a Jeremy Irons e Mélanie Laurent juntam-se nomes como os de August Diehl, Martina Gedeck, Bruno Ganz, Charlotte Rampling Lena Olin, Christopher Lee, Beatriz Batarda, Marco D'Almeida e José Wallenstein -, o dinamarquês debruça-se sobre uma das épocas mais negras da História portuguesa. E se o retrato dos anos de ditadura nem sempre sai exacto - evita-se abordar a dimensão social em toda a sua plenitude -, o esforço será, pelo menos, de louvar, ainda para mais num país que insiste em esquecer - e bem se diz a meio que «quando a ditadura é um facto, a revolução é um dever» - as suas décadas mais obscuras.

Apesar de algumas decisões criativas mais duvidosas - a questão linguística, com as personagens a falarem todas automaticamente em inglês, ou a visão algo turística com que August filma Lisboa -, Night Train to Lisbon revela-se um filme interessante. A mim, pelo menos - e admitindo que para muitos nunca passará de um mero pastel dramático e pseudo-filosófico -, proporcionou uma das mais belas viagens cinematográficas dos últimos anos.


Título original: Night Train to Lisbon (Alemanha/Portugal/Suiça, 2013)
Realizador: Bille August
Argumento: Greg Latter, Ulrich Herrmann (baseado no romance de Pascal Mercier)
Intérpretes: Jeremy Irons, Mélanie Laurent, Jack Huston, Martina Gedeck, Tom Courtenay, August Diehl, Bruno Ganz, Lena Olin, Charlotte Rampling, Marco D'Almeida, Christopher Lee, Adriano Luz
Música: Annette Focks
Fotografia: Filip Zumbrunn
Género: Aventura, Mistério, Romance, Thriller
Duração: 111 minutos


quarta-feira, 20 de março de 2013

Fantasporto 2013: de Monte Maior às fontes de Gerénia em doze badaladas

No meio do frenesim provocado pela presença de Manoel de Oliveira no Rivoli - muito a propósito dos setenta anos do seu ANIKI BÓBÓ -, não seria difícil ignorar que ao fundo das escadas se celebrava outro realizador português. E logo um dos mais influentes da sua geração. Quatro obras de António de Macedo foram exibidas durante o Fantasporto 2013, recordando aquele que foi o primeiro português a concurso em Cannes e um pioneiro técnico, tecnológico e temático no Cinema Português. Presença forte do Fantástico em Portugal, os quatro trabalhos de Macedo projectados no certame - datados de 1975 a 1993 - proporcionaram uma viagem maravilhosa a quem teve o prazer de os visualizar. Nós não fomos excepção: marcamos presença em três das sessões - escapou-nos a de O PRINCÍPIO DA SABEDORIA -, imersos naquele Universo fantástico tão nosso.

OS ABISMOS DA MEIA-NOITE, de António de Macedo (Portugal, 1984)

Escrever que OS ABISMOS DA MEIA-NOITE marcou a entrada de António de Macedo no domínio do esotérico, apesar de verdadeiro, poderá assumir-se como algo redutor. Até porque ficara para trás, quase há uma década, O Princípio da Sabedoria,  um filme que deve igualmente muito ao Fantástico. Mas simplificando a questão ao essencial, e voltando à afirmação inicial, há claramente algo de místico em Os Abismos da Meia-Noite. Mesmo que não se consiga explicar a sua natureza.

Nesse aspecto em particular, Ricardo e Irene (Rui Mendes e Helena Isabel, respectivamente) fazem, dentro da fita, as vezes do público. Puxados para um  mundo que lhes é estranho, são interrogados por uma personagem estranha, de vestes brilhantes, que tenta também ela perceber o que os levou àquele lugar. A recriação dos acontecimentos, através da memória dos dois intrusos, encontra paralelo no próprio Cinema enquanto objecto - não estará também o Magíster a ver um filme? -, um mecanismo que se tornaria frequente no trabalho de Macedo.

Essa posição bastante peculiar em relação ao Cinema, aliada a uma extraordinária compreensão do som - para a qual a música do filho, António de Sousa Dias, muito terá contribuído durante as suas colaborações - como dimensão própria, faz de Os Abismos da Meia-Noite um filme particularmente curioso - mesmo que, a espaços, pareça que se prolonga muito para lá do necessário - dentro da filmografia de António de Macedo.

Em Monte Maior há uma porta que se abre durante as doze badaladas da véspera de Natal. Cabe, no entanto, a cada espectador decidir se a recompensa justifica o risco de a ultrapassar. Quanto a mim, recomendo a aventura. (ATF)

OS EMISSÁRIOS DE KHALOM, de António de Macedo (Portugal, 1988)

Por vezes há que dar crédito ao produto nacional, que, embora não seja muito difundido e pouca gente lhe dê o mérito merecido - o bom Cinema português, de facto, existe - é, definitivamente, inovador e de qualidade. Uma das devidas homenagens vai para António de Macedo, realizador de diversos títulos da filmografia portuguesa, um verdadeiro pioneiro que introduziu no nosso país o Cinema Fantástico.

OS EMISSARIOS DE KHALOM é um exemplo desses trabalhos, onde o Fantástico é o principal tema, incluindo não só elementos históricos como também um tema diferente e ao Cinema português do século XX. Embora os elementos mais teatrais do filme possam afastar o mais comum dos espectadores, não deixa de ter o seu encanto, nem que seja pela novidade, tendo em conta o país e o ano de produção. (WJR)

CHÁ FORTE COM LIMÃO, de António de Macedo (França/Portugal, 1993)

Diga-se, logo a abrir, que CHÁ FORTE COM LIMÃO é um filme de Terror soalheiro e iluminado. Isso mesmo, caro leitor, bem diurno, à moda mediterrânica, com fantasmas trágicos e filósofos. E um casarão assombrado, com toda a espécie de convidados. E um jovem fatalista metido em duelos com rivais amorosos, uma moça impressionável e mais segredos e intrigas do que uma tarde no Parlamento.

Esse Fantástico bem nosso - e que nunca abandonou a obra do cineasta - transforma a última longa-metragem ficcional de António de Macedo num objecto de raro interesse. Há toda uma construção positiva por detrás da narrativa - manifestada igualmente pela luz que inunda a tela e pelos fades a branco - que teima em contrariar as convenções do género. E a fotografia de Manuel Costa e Silva - das melhores do Cinema Português, arrisco-me a avançar - muito terá ajudado nesse sentido.

Escreva-se, aliás, que todo o filme é um prodígio técnico, da música à direcção artística. Não deixa, contudo, de ser algo irónico que uma carreira como a de António de Macedo - tão ligada ao progresso e à inovação - encontre o seu término num drama de época. Mas quando o resultado prima pela excelência, pormenores desses podem dar-se ao luxo de ser ignorados. E Chá Forte com Limão é mesmo um dos grandes filmes portugueses dos anos 90. (ATF)

terça-feira, 19 de março de 2013

Dia do Pai

A ver um só filme no Dia do Pai - e pretendendo seguir o tema da data -, a nossa escolha recai sobre um dos mais impactantes de Jim Sheridan.

IN THE NAME OF THE FATHER (1993), de Jim Sheridan

Trailer de "Frances Ha"

Já ninguém desconfia da (eventual) qualidade de um novo título de Noah Baumbach, talento emergente no cinema independente norte-americano. O seu mais recente, FRANCES HA - sobre uma aspirante a dançarina que não é bem uma dançarina - passará durante o próximo mês no IndieLisboa. Ainda sem data de estreia comercial agendada para Portugal, à malta do Porto - e arredores - resta ver o trailer e esperar ansiosamente.


segunda-feira, 18 de março de 2013

Masterclass de Michael Glawogger


Michael Glawogger, um dos mais influentes documentaristas em actividade - também com currículo firmado na ficção experimental - , deu uma masterclass no Planete Doc Film Festival, em Varsóvia. O autor de WORKINGMAN'S DEATH abordou os desafios de realizar documentários, o seu processo criativo e até a própria questão da autoria. Uma palestra com Wolfgang Thaler, o seu cinematógrafo habitual, sentado ao lado e de cerveja na mão.

O Doc Alliance Films disponibiliza a masterclass de Glawogger e o filme WORKINGMAN'S DEATH para visualização gratuita no seu site oficial.

Dois anos

Parece que foi ontem, mas afinal foi mesmo há dois anos.

O Matinée Portuense abriu portas há dois anos, com uma crítica a ZIBAHKHANA, filme de terror paquistanês. Gostaríamos de acreditar que a qualidade dos textos foi melhorando com o passar do tempo. Para o futuro temos planeadas algumas mudanças entusiasmantes - entre as quais um necessário facelift à pagina - e muito mais Cinema.

E está assim celebrada a efeméride, de copo de whiskey na mão e fotograma de CAT ON A HOT TIN ROOF, de Richard Brooks, no ecrã. Haja saúde!

domingo, 17 de março de 2013

Sunday Stills #29: "The Wizard of Oz"



Uma semana após a estreia em Portugal de OZ THE GREAT AND POWERFUL, de Sam Raimi, porque não revisitar a adaptação mais popular do universo de L. Frank Baum? O fotograma da semana é extraído de THE WIZARD OF OZ (1939), de Victor Fleming, obra intemporal e sempre presente no imaginário cinéfilo.

sábado, 16 de março de 2013

Jack the Giant Slayer (2013)

Não há como negar o interesse renovado que o Digital e a CGI provocaram nos contos-de-fadas. As potencialidades oferecidas pelas tecnologias na (re)criação de novos - e velhos - universos revelaram-se por si só mais do que suficientes para seduzir uns quantos realizadores de renome a aventurarem-se por aqueles terrenos. Bryan Singer é uma das mais recentes adições à lista - que já vai longa -, com o seu JACK THE GIANT SLAYER.


Cedo se percebe o rumo pretendido para o filme. Orientando para um público jovem - Jack é tão cool que se passeia pelo pé-de-feijão de casaco de couro -, usa e abusa-se dos habituais lugares-comuns e convenções do género. Previsível e vulgar, há, contudo, um aparente cuidado em trabalhar essas noções - e a do boy meets girl é especialmente bem aproveitada - a favor da narrativa. Essa inteligência, habitualmente demonstrada nas obras de Singer, permite a Jack the Giant Slayer manter-se à tona.

E não fosse o norte-americano um cineasta inteligente - mesmo quando os filmes não lhe saem tão bem -, o caldo estaria entornado. De um argumento algo desinspirado consegue tirar um par de cenas bem conseguidas, excepções num filme incapaz de se arrancar da mediania. E se a direcção de actores deixa algo a desejar - já para não falar do 3D, que aqui não consegue ser mais do que um estorvo -, é a habilidade de Singer que impede males maiores.

Subtilmente simétrico, recheado de aventura e humor infantil, Jack the Giant Slayer, não sendo um filme extraordinário - nem para lá perto caminhar -, cumpre, pelo menos, com o que se lhe pede.


Título original: Jack the Giant Slayer (EUA, 2013)
Realizador: Bryan Singer
Argumento: Darren Lemke, Christopher McQuarrie, Dan Studney, David Dobkin
Intérpretes: Nicholas Hoult, Eleanor Tomlinson, Ewan McGregor, Stanley Tucci, Eddie Marsan, Ian McShane, Bill Nighy
Música: John Ottman
Fotografia: Newton Thomas Sigel
Género: Aventura, Drama, Fantasia
Duração: 114 minutos


Trailer de "The Bling Ring"

Somos confessos admiradores dos filmes de Sofia Coppola. Não será por isso de estranhar que por cá se aguarde com a devida antecipação - até por tratar-se do último trabalho de Harris Savides, um director de fotografia magnífico - THE BLING RING, o mais recente projecto da norte-americana. Ainda sem estreia agendada para Portugal, a fita já conta, contudo, com trailer.


sexta-feira, 15 de março de 2013

Kim Longinotto no Porto


Kim Longinotto virá ao Porto para acompanhar uma retrospectiva da sua obra. Oportunidade única para ver - ou rever - o trabalho de uma das mais importantes documentaristas da actualidade.

Uma das mais proeminentes documentaristas em actividade, Kim Longinotto, é reconhecida internacionalmente pelos seus pungentes retratos e pelo seu sensível e apaixonante tratamento de tópicos difíceis.

Observando, reflectindo e contando as estórias de mulheres que desafiam convenções e lutam contra instituições, opressão e preconceitos, Longinotto documenta e revela as idiossincrasias e os costumes de sociedades oprimentes.

Passando por temas tão diversos como o divórcio no Irão, a mutilação genital feminina no Quénia, a violência sobre mulheres e crianças nos Camarões, na África do Sul ou na Índia, a educação de crianças emocionalmente perturbadas em Inglaterra ou mesmo questões de género, identidade sexual e contradições culturais no Japão, Longinotto assume-se politicamente comprometida, viajando pelo mundo inteiro para documentar os aspectos mais difíceis da realidade das mulheres.

Navegando pelas águas do documentário, desde que iniciou a sua carreira em 1976, trabalhando quase sempre com equipas reduzidas – a própria, na câmara, uma co-realizadora local e apenas uma pessoa no som – e mantendo-se sempre independente de quaisquer produtoras, Longinotto tem conseguido financiar o seu trabalho através da emissão dos seus filmes na BBC e vem conquistando a sua importância cinematográfica através do florescente circuito dos festivais de cinema.
Quase todos os seus filmes foram premiados um pouco por todo o mundo, sendo que “Sisters in Law” recebeu o Prémio Arte e Ensaio do Festival de Cannes, “Hold me tight, Let me go” foi galardoado com o Prémio Especial do Júri no Festival Internacional de Documentário de Amesterdão e “Rough Aunties” ganhou o Prémio do Júri na competição World Cinema do Festival de Sundance.

Esta será a primeira retrospectiva dedicada a Kim Longinotto no nosso país, uma realizadora que importa descobrir urgentemente.

Os ciclos decorrem de 28 a 30 de Março no Cinema Passos Manuel, no Porto, e de 4 a 7 de Abril no Cinema City Classic Alvalade, em Lisboa. Mais informações e respectivo programa aqui.

quinta-feira, 14 de março de 2013

Conversa de travesseiro #1

Jean Gabin e Michèle Morgan protagonizaram em 1938 uma das cenas mais memoráveis do Cinema clássico francês. Em LE QUAI DES BRUMES, de Marcel Carné, a câmara encontra a dupla na cama, abraçados, numa demonstração de sexualidade completamente impensável para o Cinema norte-americano - leia-se, Hollywood - da altura.


LE QUAI DES BRUMES (1938), de Marcel Carné

quarta-feira, 13 de março de 2013

O Fantas em números

A Matemática nunca foi o nosso forte. Ainda assim, decidimos abraçar o desafio de tentar explicar por números a nossa cobertura desta edição do Fantas.

  • 39 longas-metragens (31 inéditos + 8 clássicos)
  • 81% das longas-metragens inéditas visualizadas
  • 77% notas positivas (entre as longas-metragens inéditas)
  • 19% notas negativas (entre as longas-metragens inéditas)
  • 2 filmes inclassificados
  • 31% notas ≥ 7/10 (entre as longas metragens inéditas)
  • 6 entrevistas
  • 78 horas dedicadas ao festival (em filmes) durante 9 dias (8,5 horas por dia)

Digam lá se não é motivo de sobra para sair do Rivoli cansado.

terça-feira, 12 de março de 2013

Nem pareceram 70 anos

Não é todos os dias que um filme celebra 70 anos. Melhor, não é todos os anos que um filme como ANIKI BÓBÓ celebra a data. Para assinalar a efeméride, o Fantasporto exibiu a obra no Grande Auditório do Rivoli - em horário privilegiado -, numa sessão que contou com a presença de Manoel de Oliveira e Fernanda Matos.


Sobre a enchente de jornalistas e a selvajaria que teve lugar no átrio do Rivoli não se escreverá aqui - até porque o Nuno Reis, do Antestreia, já o fez, e muito bem, diga-se de passagem -, merecendo o nosso destaque o filme em si. Nunca me tinha apercebido, até o ver projectado em grande ecrã, do quão bem envelheceu Aniki Bóbó. Do tema - a hipocrisia na sociedade - ao trabalho técnico, a estreia de Oliveira nas longas ficcionais mantém-se, ainda hoje, uma obra actual e necessária de ser (re)descoberta.

O filme que antecipou o neorrealismo italiano num ano - OSSESSIONE, de Luchino Visconti, obra que alguns críticos colocam na origem do movimento, só estrearia em 1943 - revelaria logo no início da sua carreira a preocupação de Manoel de Oliveira com a sociedade e os seus problemas. E o amor pelo Porto - que aqui filma como só ele sabe, em belos planos da Ribeira -, a sua cidade (que é também nossa). Em tempos de «um micro-país chamado Lisboa», é sempre bom recordar que há mais Portugal. E vê-lo tão bem representado. Pelo que fez - e pelo que ainda lhe falta fazer -, a Manoel de Oliveira, Decano dos realizadores, o nosso mais sincero obrigado.

«Aniki-bébé, Aniki-bóbó, Passarinho Tótó, Berimbau, Cavaquinho, Salomão, Sacristão, Tu és Polícia, Tu és Ladrão.»

segunda-feira, 11 de março de 2013

8 ½ Festa do Cinema Italiano 2013 no Porto

A Primavera traz consigo coisas boas. De 4 a 7 de Abril - e depois de uma passagem por Lisboa de 20 a 28 de Março -, o 8 ½ Festa do Cinema Italiano regressa ao Porto.

O 8 1/2 Festa do Cinema Italiano é uma iniciativa da associação Il Sorpasso em colaboração com a o Instituto Italiano de Cultura e a Embaixada de Itália em Portugal.

Criado em 2008, o 8 1/2 é um festival que nasceu e cresceu em Portugal, fruto do trabalho de uma equipa constituída por profissionais portugueses e italianos, e que se encontra profundamente enraizado na cultura e na sociedade portuguesa. Tem como missão a exibição de obras que cumpram elevados critérios de qualidade, sejam elas de autores consagrados ou da nova geração de cineastas, sempre fiel ao objectivo de trazer a Portugal o melhor do cinema Italiano.

O 8 ½ Festa do Cinema Italiano regressa em 2013, de 20 de Março a 9 de Junho, para celebrar a sua 6ª edição com o objetivo de trazer a Portugal uma seleção das mais relevantes produções cinematográficas italianas.

À semelhança do que aconteceu na passada edição, os espetadores do 8 ½ têm uma palavra a dizer, através do prémio do público, distinção que, a par do Prémio Oficial Rottapharm – Madaus - atribuído pelo painel dos jurados do 8 ½ - visa distinguir os filmes em competição.

Para dar continuidade ao seu processo de itinerância e devido ao elevado grau de aceitação que o 8 1/2 obtém um pouco por todo o país, este ano a Festa faz-se à estrada novamente e vai até a Coimbra, Funchal, Porto, chegando, pela primeira vez ao Algarve, mais precisamente à cidade de Loulé. Esta edição é também pautada pela primeira incursão do 8 ½ no circuito internacional, voando em Junho até Luanda, Angola.

A realização da Festa do Cinema Italiano não seria possível sem a fundamental colaboração das muitas entidades que apoiam e patrocinam o evento. A todas elas, a organização dirige os seus mais sinceros agradecimentos, com menção especial à Embaixada de Itália, Instituto Italiano de Cultura de Lisboa, Câmara Muncipal de Lisboa/EGEAC, Cinema São Jorge e ao patrocinador Ofical, 
Rottapharm – Madaus.

Vida de sonoplasta

E assim se faz um giallo pelo som.











BERBERIAN SOUND STUDIO (2012), de Peter Strickland