segunda-feira, 27 de outubro de 2014

El laberinto del Fauno (2006)


Não é preciso procurar muito a fundo na filmografia de Guillermo del Toro para perceber que, a dada altura, a guerra se tornou um dos seus principais motores. E que a dimensão da guerra acompanha, em regra, o crescendo dos próprios filmes: à guerra civil espanhola seguiu-se a entre o Bem e o Mal, parando-se, por agora, numa autêntica guerra inter-dimensional. E é exactamente por esse motivo que EL LABERINTO DEL FAUNO surge como um passo algo anacrónico - e deslocado - no percurso do mexicano. Desde logo, porque se intromete entre duas adaptações de comics (e lá está o confronto entre o Bem e o Mal, entre a Humanidade e os monstros), retomando o pano que serve de fundo a El espinazo del Diablo (a diferença entre as duas obras prender-se-á, fundamentalmente, com as feridas ainda estarem abertas em El laberinto, enquanto que El espinazo se encontram já em processo de cicatrização). Mas, e mais importante ainda, também porque quebra a natural tendência de expansão em relação às produções que o emolduram, assumindo-se, à primeira vista, como uma guerra "menor".


Contudo, indiferente a essas questões, El laberinto apresenta-se como o melhor filme que del Toro assina em nome próprio. Ou, para os que não o vêem como tal, pelo menos como o mais humanista e pessoal do espólio. Note-se que a verdadeira luta se faz pela preservação da inocência de Ofelia - e, nesse sentido, não deixa de ser curioso um dos significados atribuídos por del Toro ao labirinto, enquanto símbolo da viagem espiritual da protagonista: «I can ascribe two concrete meanings of the labyrinth in the movie. One is the transit of the girl towards her own center, and towards her own, inside reality, which is real. [...] And I have found that [the inner] reality is as important as the one that I’m looking at right now». O próprio Vidal parece admiti-lo ao desvalorizar a resistência dos republicanos, que mais cedo ou mais tarde seriam vencidos, escolhendo debruçar-se, gradualmente, na que lhe é oferecida pela sua enteada.

Poderíamos argumentar que a mesma luta interior/exterior do/pelo protagonista se estende aos restantes trabalhos de del Toro - e, julgo, não seria disparate nenhum, vejam-se os casos de Hellboy com a sua natureza demónica, de Blade com o vampirismo, ou de Becket, de Pacific Rim, com a morte do seu irmão -, mas em El laberinto aproxima-se mais do público pela dimensão mais reduzida do ambiente que a rodeia.

Será essa a grande virtude de El laberinto (que advém, exactamente, da maior concentração espacial/pessoal): del Toro, que sempre foi mais storyteller do que director de actores, mostra-se capaz de construir personagens de raiz como nunca antes o tinha feito (e como nunca o voltou a fazer desde então). É essa a essência da fábula que desenha, a relação que as personagens, reais e/ou imaginárias, estabelecem entre si. Não será, pois, por acaso que o Fauno entra em cena como um peão absolutamente ambíguo, de intentos insidiosos, algures entre o maniqueísmo da realidade fora da qual existe: é ele o símbolo máximo da batalha travada entre a imaginação de Ofelia e a pressão dos que tentam que ela a abandone.

Devido a essa simbologia e ambiguidade constantes, bem como por o ter visto (e sentido) inúmeras vezes, é-me mais complicado escrever sobre El laberinto do que sobre qualquer outro dos títulos de del Toro. A interpretação do seu conteúdo dependerá, em muito, do que cada um escolha ver e entender daquele universo perdido entre árvores e ruínas. Se é brilhante? Sempre acreditei que sim. Mas mesmo que não o seja, a capacidade demonstrada em esbater barreiras - entre géneros, entre mundos, e, sobretudo, entre pessoas - torna-o um filme de público, hábil em reunir paixões e seguidores. E, parece-me, para del Toro tanto já bastará.


Título Original: El laberinto del Fauno (Espanha/EUA/México, 2006)
Realizador: Guillermo del Toro
Argumento: Guillermo del Toro
Intérpretes: Ivana Baquero, Segi López, Maribel Verdú, Doug Jones, Ariadna Gil
Música: Javier Navarrete
Fotografia: Guillermo Navarro
Género: Drama, Fantasia, Guerra, Terror
Duração: 118 minutos


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