Sophie: «I don't know. I mean, I don't really know who you are, do I?»
Hanna: «That's just it. Neither do I.»
Cedo se percebe que Hanna está longe de ser uma inocente menina. Matar alces não é para todos, muito menos lutar com homens com o dobro do seu tamanho. Viver no Árctico sem electricidade também não é pêra doce. É, Hanna está longe do arquétipo da adolescente indefesa ou da donzela em apuros. Ou, também nunca será demais mencionar, das anteriores personagens interpretadas por Saoirse Ronan. Pormenores demasiado pequenos para não serem facilmente contornados por uma das melhores actrizes da sua geração. O seu pai (Eric Bana) treinou-a para assassinar a mulher que lhe matou a mãe. Só que falar é mais fácil do que fazer, e Marissa Wiegler (Cate Blanchett) vai-se revelar um osso duro de roer. Pelo meio há ainda uma família britânica de férias em Marrocos que acolhe Hanna, um esquadrão de sádicos assassinos alemães e um estranho homem que vive num parque de diversões dedicado aos Irmãos Grimm. E tudo serve para perguntar: afinal, quem é Hanna?
Será Hanna uma pobre rapariga que teve o azar de crescer longe das comodidades do Mundo moderno, educada por um homem com uma agenda demasiado negra, ou uma assassina de sangue frio, com a morte a correr-lhe nas veias? A aura de fantasia, semelhante à de um conto de fadas negro, domina quase completamente a película, com referências aos contos dos Irmãos Grimm a multiplicarem-se ao longo da obra. A banda sonora dos The Chemical Brothers também aponta nessa direcção (é complicado conseguir deixar de assobiar a melodia da deliciosa The Devil Is In The Details), remetendo o espectador para um ambiente próximo da possível fusão entre A Clockwork Orange e as histórias de embalar. Conceitos que, embora ao início possam parecer distantes entre si, combinam quase na perfeição, dando espaço a Hanna para evoluir dentro do seu próprio universo retro-futurista. Assim como se Kubrick de repente fosse um dos Grimm, e Alex DeLarge Rumpelstiltskin.
Este Hanna apresenta-se como um falso filme de acção. Do trio de estrelas só uma está habituada, mesmo que pouco, a entrar em filmes do género (merecedor da dúbia distinção de quase ter assassinado Hulk como personagem), e o próprio realizador claramente prefere as produções de época a estas incursões pelo cinema mais contemporâneo. Contudo, Hanna (filme e personagem) não fica a dever nada a ninguém, afirmando-se como uma alternativa válida dentro de um género sobrelotado na sua maioria por filmes de medíocre qualidade. Mesmo não sendo esta a sua praia, de Joe Wright já sabia ser um dos melhores realizadores da actualidade, e o britânico esforça-se por não desiludir quem nele confiou para timoneiro deste barco (piscadela de olho a Saoirse Ronan, que o requisitou quando o projecto estava ainda sem direcção). Mais: foi capaz de se rodear de uma equipa bastante competente, da fotografia à edição, acabando, inevitavelmente, na banda sonora da autoria dos The Chemical Brothers. Provas do talento de alguém que, por esta altura da sua carreira, já pouco ou nada terá a provar a quem acompanha a sua evolução.
Um elenco fabuloso e uma realização competente mantiveram à tona aquele que poderia muito bem ter sido o naufrágio do ano. Da fita, a tempos demasiado linear e previsível, é possível salvar alguns momentos de enorme qualidade cinematográfica, como as sequências na base subterrânea, a cena da chegada da personagem de Bana a Berlim, ou até mesmo a cena final, carregada de simbolismo e força. E será que já referi a banda sonora? O resultado final podia ter sido melhor, mas Hanna está longe de ser um mau filme. Na fronteira entre o razoável e o bom, talvez. No fim fica ainda por responder: afinal, quem é Hanna?
Realizador: Joe Wright
Argumento: Seth Lochhead, David Farr
Intérpretes: Saoirse Ronan, Cate Blanchett, Eric Bana, Olivia Williams, Jason Flemyng, Jessica Barden
Música: The Chemical Brothers
Fotografia: Alwin H. Kuchler
Género: Acção, Crime, Mistério, Thriller
Duração: 111 minutos
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