quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Lincoln (2012)

É impossível negar que grande parte da carreira de Steven Spielberg se encontra intimamente ligada - e vice-versa - ao Cinema norte-americano produzido desde o último quarto do século XX. Cineasta que se desmultiplica em géneros - quer como realizador, quer como produtor -, Spielberg nunca teve medo de assumir o risco nas suas obras. Curiosamente, ou talvez nem tanto, LINCOLN não será dos seus projectos mais atrevidos, revelando-se, no entanto, um dos melhores a sair da sua câmara neste novo milénio.


Recriação das semanas que levaram à promulgação da Emenda que extinguiu a escravatura nos EUA - e dos meios pelos quais se obtiveram os votos necessários -, na altura em guerra civil, Lincoln cedo demonstra, através de um primeiro - e, para todos os efeitos, último - plano de batalha, lamacento e confuso, a sua superioridade técnica em relação às habituais alternativas do género. A magnífica direcção de fotografia de Janusz Kamiński, aliada às irrepreensíveis direcções de arte e figurino, capta na perfeição o ambiente da época, abundante em sombras e tons esmaecidos, e imerge o espectador na narrativa. O trabalho iniciado na imagem - e, nesse sentido, a direcção de Spielberg é muito segura, guiando o filme cuidadosamente por  enquadramentos e cortes - é complementado pela sonoplastia, com a banda-sonora de John Williams a alternar magistralmente entre estados de espírito e de humor. De resto, a competência de Lincoln a nível dos vários departamentos faz dele um excelente filme de época e principal candidato aos prémios - leia-se, Oscars - que se avizinham.

Mas, e apesar da inegável qualidade técnica, o melhor do filme concentra-se no elenco. Daniel Day-Lewis, discutivelmente o actor mais talentoso da sua geração, volta a compor uma personagem como só ele sabe, transformando-se completamente em Lincoln; do discurso aos maneirismos, a metamorfose é verdadeiramente espantosa. Fica-se com um Presidente carismático, amado pelo povo - a mulher chega a dizer-lhe, em tom de aviso, « No one is loved as much as you by the people.» -, e líder dos seus, muito bem secundado, sobretudo, por Sally Field e Tommy Lee Jones.

Spielberg volta a apostar no Drama, terreno por onde se tem movido com mais frequência nas últimas décadas - e que lhe tem valido muitos galardões -, como forma de relembrar a História - no mesmo ano em que Quentin Tarantino tentou um resultado semelhante com o seu Django Unchained - e despertar reflexões. E fá-lo através de um filme imenso - tanto na mensagem como na duração -, apelando ao lado emocional do público como poucos o sabem fazer. Lincoln, à imagem da personagem epónima, não surge livre de falhas e defeitos; antes, sabe jogar com elas e contorná-las, evidenciando o que tem de melhor. Aconselhado como um dos melhores de 2012 e prova de como Hollywood ainda não se perdeu definitivamente.


Título Original: Lincoln (EUA, 2012)
Realizador: Steven Spielberg
Argumento: Tony Kushner (baseado, em parte, no livro de Doris Kearns Goodwin)
Intérpretes: Daniel Day-Lewis, Sally Field, Tommy Lee Jones, David Strathairn, Joseph Gordon-Levitt, James Spader, John Hawkes, Hal Holbrook, Jackie Earle Haley, Jared Harris, Lee Pace
Música: John Williams
Fotografia: Janusz Kamiński
Género: Biografia, Drama, Histórico
Duração: 150 minutos


1 comentário :

  1. Esta crítica mereceu destaque na rubrica «A “Polémica” do Mês» do Keyzer Soze’s Place, disponível aqui: http://sozekeyser.blogspot.pt/2013/02/a-polemica-do-mes-20.html

    Cumps cinéfilos.

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