domingo, 30 de novembro de 2014
Boyhood (2014)
Depois de ver BOYHOOD sinto-me completamente esmagado perante a brutalidade com que a pelicula encara a realidade. Não se trata apenas de mais um coming-of-age. O que vemos são dinâmicas de um quotidiano que, de tão mundano, tão comum, tão vulgar e ao mesmo tempo tão único, se torna, ele mesmo, um buraco negro capaz de sugar o espectador para o próprio ambiente fictício que cria no invólucro da existência (também ele, diga-se de passagem, incrivelmente rico, natural e verdadeiro).
O filme é simplesmente avassalador. Avassalador pela maneira como retrata a vida, e avassalador pela forma como o faz.
Não há intermitências no plano temporal de Boyhood- porque também não as há na vida. O tempo avança implacavel e impiedosamente traçando, em duas horas e meia, o desenvolvimento de Mason (Ellar Coltrane) de um modo longitudinal.
Contando com actuações absolutamente excepcionais, a narrativa, linear e coesa, expressa harmonia na proporção de drama, comédia, sentimentos e emoções. O argumento é fluído, não existe um sem-sentido nas falas dos indivíduos que não se encaixe perfeitamente naquilo que é a norma em qualquer discurso. Os planos, simplistas e centralizados, são desprovidos de uma necessidade de grandeza, limitando-se a projectar acontecimentos no ponto de vista de alguém que os esteja a ver de fora- e no entanto, é tão fácil para nós (esse alguém que está de fora) identificar-mo-nos com as personagens. Quer sejamos uma criança de 7 anos que se despede com nostálgica tristeza da cidade onde vive, quer sejamos um miúdo de 13 anos que se tenta inserir numa nova escola. Um pai ausente, que procura restabelecer laços afectivos com os filhos, ou uma mãe que tenta desesperadamente conciliar um trabalho precário com a educação dos mesmos. Não importa quem. Não interessam as circunstâncias. Boyhood é a história de uma vida: a minha, a sua, ou a do seu vizinho.
Richard Linklater ousa deliciar-nos com 12 anos de vivências sem flashbacks, grandes adornos ou efeitos especiais. Uma década (e mais uns trocos) do progresso das personagens, não só enquanto elementos figurativos extrapolados da criatividade de uma mente brilhante (que é a de Linklater), mas também das personagens enquanto actores, representações reais do mundo objectivo.
Estamos, portanto, na presença de uma obra de arte sem igual, uma experiência cinematográfica como nunca antes vista e que, seguramente, não o será outra vez tão cedo.
Título Original: Boyhood (EUA, 2014)
Realizador: Richard Linklater
Argumento: Richard Linklater
Intérpretes: Ellar Coltrane, Patricia Arquette, Ethan Hawke, Lorelei Linklater, Marco Perella
Fotografia: Lee Daniel, Shane F. Kelly
Género: Drama
Duração: 165 minutos
Etiquetas:
Críticas
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Drama
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Richard Linklater
sexta-feira, 28 de novembro de 2014
300: Rise of an Empire (2014)
Do realizador Noam Murro e com a
participação de Zack Snyder, nasce a sequela do filme 300 na tentativa
de recriar o sucesso entre o público. 300: RISE OF AN EMPIRE retrata a
continuação da guerra entre a Grécia e a Persa mas desta feita, pela prespecitva
ateniense.
Themistokles (Sullivan Stapleton)
é um general ateniense encarregado de unir a Grécia e preparar a defesa contra
a ofensiva militar persa liderada por Xerxes (Rodrigo Santoro). A acção vai se
desenrolar em paralelo com a do primeiro filme mas desta vez, no mar onde a poderosa
frota persa controlada por Artemisia (Eva Green) dominava. Mais uma vez, os
gregos são colocados numa situação de uma colossal desvantagem numérica que
Themistokles tem que lidar, usando astucia e estratégias militares para impedir
o avanço persa.
O filme anterior era apenas sobre
guerreiros bem treinados em combate diário com inovadoras cenas de acção que
impressionam o espectador e não deixava de transmitir um certo heroísmo pelo sacrifício
destes trezentos heróis. Este filme no entanto, trata-se apenas de sangue em
3D. Do início ao fim somos banhados no constante sangue que jorra dos ferimentos
dos persas enquanto são trinchados em slow motion aleatório e planos que
mais parecem retirados de um jogo gore, onde as personagens deverão decerto ser
descendentes de deuses pois de outra forma não sei como seriam capazes de sobreviver
certos feitos definitivamente inumanos.
Não sei se a ideia era transmitir
o misticismo inerente a mitologia grega mas certos pontos do enredo podem ser
consideradas simplesmente treta. A tentativa de ilustrar a transformação de
Xerxes em Rei-Deus que tão cedo me deixou céptico em relação ao resto do filme
e a estranha cena de sexo são dois bons exemplos disso.
No entanto, a inferioridade de
300: O Início de um Império em comparação com o filme de 2004 não o impediu de
receber boas críticas, certamente influenciadas pelo papel de Eva Green como
Artemisa, capitã da frota persa que viveu a infância torturada e abusada por
captores gregos, sendo afectada por um ódio profundo e uma sede de vingança
pela Grécia. A grande actuação da viciosa e implacável Artemisa conseguia
sempre prender a atenção, e constitui um ponto positivo do filme.
Para os que apreciaram o filme
antecessor, deverão ser capazes de ver este filme com algum interesse. Se não
são fãs do sague e violência do primeiro, será um filme a evitar pois é apenas
um aumento no gore a juntar a maus efeitos especiais e piores slow motions.
Realizador: Noam Murro
Argumento: Zack Snyder, Kurt Johnstad
Intérpretes: Sullivan Stapleton, Eva Green, Lena Headey, Hans Matheson, Callan Mulvey, David Wenham, Rodrigo Santoro
Música: Junkie XL
Fotografia: Simon Duggan
Género: Acção, Fantasia
Duração: 102 minutos
quinta-feira, 27 de novembro de 2014
Virados do Avesso (2014)
Pelo trailer - dos spots publicitários mais bizarros do Cinema Português recente -, e conhecendo o background de Edgar Pêra, já se adivinhava que VIRADOS DO AVESSO seria das duas uma: ou um filme tão experimental, mas tão experimental, que ninguém perceberia que o era, ou um objecto tão vulgar nos seus modos que, paradoxalmente, seria entendido como absolutamente experimental. Sem o benefício da digestão (até porque não creio que o seu principal problema seja o de ser particularmente indigesto, mas já lá iremos), não me consigo decidir em qual das hipóteses se encaixa melhor.
Uma coisa, contudo, é certa: Virados do Avesso será dos maiores manguitos lançados ao público português, porventura maior até do que o João César Monteiro lançou com Branca de Neve (mas menos satisfatório). Vejamos, correndo o risco de arrastar, em massa, espectadores às salas - e não é de todo descabido julga-lo capaz de rivalizar com os números de Balas & Bolinhos, Morangos com Açúcar - O Filme ou 7 Pecados Rurais -, será dos primeiros casos, se não mesmo o primeiro, em que um autor tão vincado é capaz de o fazer entre-fronteiras. E a malta que não conhece Pêra (a grande maioria, arrisco-me a avançar) nem desconfiará que está perante um dos grandes realizadores experimentais da actualidade.
A questão aqui, portanto, não se prenderá tanto com a inteligência, ou a falta dela, da premissa como com a tentativa de compreender o motivo que levou Pêra a descer tão baixo. Será que a velha dicotomia do Cinema Português - comercial versus de autor - não teria sido, ainda assim, uma vez mais reacendida caso o filme em questão não fosse tão mau (e, pior, assumidamente mau)? Porque Pêra, ao contrário do seu protagonista, não se esqueceu do experimentalismo da noite para o dia. A prova está na montagem, presa entre o slow e o fast motion, das mais excêntricas na filmografia nacional. E se se ri ao apresentar um produto tão abaixo da sua bitola, já nem o faz genericamente (como se diz, às tantas, no filme), mas claramente às custas de quem pagou para o ver.
O problema está na vacuidade extrema (dos estereótipos ocos ao humor brejeiro) a que Pêra se entrega para mostrar - ou denunciar, conforme se tenha maior ou menor vontade em compreender a sua intenção - o dilema do autor que se prostitui ao comercial. Na verborreia, quer literal, quer visual, que tudo domina, enche planos com Diogo Morgado - o Jesus tornado pecador e convertido em straight -, abusa da artificialidade das luzes e da trama, e utiliza um sem número de gags que, de outra maneira, não se lembraria nunca de utilizar. Mais, tenta enfiar em cada cena um novo gimmick de câmara, a ver se alguém dá por isso. É nesse tasteless - e haverá tasteless maior neste cantinho à beira-mar plantado do que colocar Anselmo Ralph a cantar as suas músicas em frente a uma câmara? -, cópia inferior ao reproduzido por Harmony Korine em Spring Breakers, até pelo ridículo a que se sujeita, que Virados do Avesso perde o fio à meada e se deixa afundar.
Pêra, à semelhança de Nick Cave, deixou de ser, a certa altura, um ser humano. Encarnou a personagem de Homem-Kâmara, filmou-se no quotidiano, filmou os outros, meteu-se no meio de Godard e Greenaway, brincou com o 3D e realizou um filme tão estranho - O Barão - que ninguém na RTP 2 reparou que estavam a exibir uma esverdeada versão inacabada antes de surgirem as queixas. Mas ninguém gosta de ver a sua inteligência insultada, mesmo que quem a insulte o faça de forma (aparentemente) inteligente. E, após ver Virados do Avesso, não deixo de me sentir assim. Pêra dançou no varão do Cinema comercial. Esperemos é que não repita a gracinha tão cedo.
Título Original: Virados do Avesso (Portugal, 2014)
Realizador: Edgar Pêra
Argumento: Henrique Cardoso Dias, Roberto Pereira, Frederico Pombares
Intérpretes: Diogo Morgado, Jorge Corrula, Marina Albuquerque, Nuno Melo, Philippe Leroux, Miguel Partidário
Música: José Joaquim de Castro
Fotografia: Miguel Sales Lopes
Género: Comédia
Duração: 96 minutos
Jessabelle (2014)
JESSABELLE, de Kevin Greutert, nada surpreende, apoiando-se num argumento disparatado, actuações medíocres e uma realização preguiçosa, é apenas mais uma fraca tentativa a um filme de terror. Parece haver uma estranha obsessão por planos frontais de Sarah Snook, uma inquietante busca artística, e um conjunto desnecessário de cenas que existem para que o filme não tenha apenas 50 minutos.
Tudo começa relativamente simples, Jessabelle (Sarah Snook), incapacitada após um acidente de viação, vê-se obrigada a voltar para casa do pai, para que este a ajude durante a sua recuperação. O que Jessabelle não sabe será a sua ruína, quando uma estranha presença a assombra e velhas cassetes de video da sua mãe predizem um destino terrível.
Inconsistente do inicio ao fim, esta fantasia de terror melodramático nunca assusta nem emociona. Os fracos desempenhos por parte dos actores apenas pioram as personagens que já pouca exposição possuem e a protagonista exausta-nos com a sua sarcástica omnipresença. Sarah Snook no papel de Jessabelle é desinteressante e consistentemente nauseante, com uma expressão estarrecida e de estupefacção constante, num esforço exaustivo de transmitir inocência sem que alguma vez pareça natural. Acompanhada por Mark Webber, no papel de Preston, formam um dos casais mais inábil e incómodos dos últimos tempos-
O pior aspecto de tudo isto será o trabalho de Kevin Greutert, indeciso nos seus modelos, parece estar constantemente a alterar de estilo, mais preocupado com uma imagem limpa e colorida do que propriamente com a coesão espacial-temporal da acção. Juntamente com o incrivelmente aborrecido e pouco inspirado argumento de Robert Ben Garant, tornam Jessabelle num terror desinteressante com uma fraca execução em todos os aspectos.
Realizador: Kevin Greutert
Argumento: Robert Ben Garant
Intérpretes: Sarah Snook, Mark Webber, Joelle Carter, David Andrews, Chris Ellis, Ana de la Reguera
Música: Anton Sanko
Fotografia: Michael Fimognari
Género: Terror, Thriller
Duração: 90 minutos
segunda-feira, 24 de novembro de 2014
As letras de Johnny Worricker
Os títulos de PAGE EIGHT, TURKS & CAICOS e SALTING THE BATTLEFIELD, todos de David Hare.
Uma breve passagem pela trilogia de Johnny Worricker, dirigida por David Hare - nomeado por duas vezes ao Oscar de Melhor Argumento Adaptado - permite-nos algumas conclusões:
I. A espionagem, mesmo quando azeda, é um negócio para gente educada.
II. Worricker, o mais jazzístico dos espiões, é uma personagem extraordinariamente cool, com Bill Nighy a espalhar um charme lacónico pelos três capítulos (um pouco à semelhança do que Gary Oldman faz enquanto George Smiley em Tinker Tailor Soldier Spy, de Tomas Alfredson, o grande filme de espionagem da última década).
III. Continuam a existir, e cada vez mais em maior quantidade, telefilmes muito interessantes.
domingo, 23 de novembro de 2014
Sunday Stills #53: "Welcome to New York"
Detenções mediáticas, políticos atrás das grades: o fotograma desta semana chega-nos de WELCOME TO NEW YORK, de Abel Ferrara.
sábado, 22 de novembro de 2014
20,000 Days on Earth (2014)
Durante muito tempo quis acreditar que o Nick Cave-artista não poderia ser o mesmo que o Nick Cave-pessoa. Enfim, que haveria alguma diferença, mesmo que eu não a soubesse ou pudesse identificar, entre os dois. Mantive esse crença desde o momento em que o meu interesse por Nick passou simplesmente das suas músicas para a figura em si (e quem o conhece perceberá perfeitamente o porquê). Depois de 20,000 DAYS ON EARTH tenho já as minhas dúvidas.
[Para contextualizar, devo escrever que, das muitas bandas que fui ouvindo durante a adolescência, Nick Cave & The Bad Seeds foi das únicas que se aguentou persistentemente nos meus leitores de música até aos dias de hoje. Não que esteja tão longe dos meus teens quanto isso, mas acho que essa preferência demonstra bem a minha admiração pela sua obra. Não se espere, portanto, muita isenção da minha parte neste caso.]
Retomando o parágrafo inicial, tenho agora dúvidas sobre a existência de uma fronteira entre as duas formas de Nick. Dúvidas sérias, devo acrescentar. Iain Forsyth e Jane Pollard - que estão já habituadíssimos a trabalhar o material de Nick - abalaram a minha fé profunda de que aquela personagem só existira, só poderia existir, numa dimensão ficcionada. Malditos sejam, por me fazerem desconfiar dos meus dogmas! Mostraram-me que, afinal, o Nick das baladas assassinas, essa criatura verdadeiramente sobrenatural, pode ser real. Não estou a dizer que seja, mas, sendo-o, a barreira que separa o performer do everyday man é vulnerável a transmissões osmóticas em ambos os sentidos. É Nick quem o admite quando fala da sua relação com a mulher: ele canibaliza-a nas letras que escreve, perpetuando, quase prostituindo, momentos íntimos em objectos para o público. Faz parte do pacto entre eles. Será uma prova de amor?
E, caso se trate de uma prova de amor, será de Amor a quê(m), à sua Arte ou à mulher? Novamente, não consigo afirmar com absoluta certeza. Nick ama a mulher, tudo bem. Mas não amará também a audiência que lhe permite a transformação (ou a sua ilusão) de que tanto fala?
Nada é claro no Universo Caveniano. Nick não deixa que seja. No seu Mundo psicanalítico, visceral, brutalmente sexualizado, não há lugar para maniqueísmos, apenas para ambiguidades. Nick não é moralista; essa tarefa reserva aos homens. Não, ele, que aspira à condição de Deus dentro da sua criação, contenta-se com a função de observador e catalisador das acções das suas projecções. Às tantas, surge uma cena de um concerto dos The Bad Seeds: Nick aproxima-se de uma jovem na primeira fila, coloca a mão dela sobre o seu coração e pergunta-lhe se o consegue sentir a bater. Ela diz quem sim, Ele diz que não. Como poderia ela, uma mera mortal, ousar sentir o seu Deus? Simples: não pode. Resta-lhe a catarse oferecida por aquele Deus diabólico, que aparecerá, invariavelmente, momentos mais tarde ao som de Stagger Lee, com Warren Ellis a tocar violino que nem um desalmado, expiação possível para todos os males deste Mundo e do Outro. A pobre moça pecou (e tanto sabe que pecou que, mal Nick se desprende, baixa logo a cabeça em sinal de contrição), mas Nick é um Deus generoso que lhe perdoa o deslize. Daquele exorcismo colectivo a que preside todos saem com a justa absolvição que procuram.
20,000 Days on Earth é, dessa maneira, um filme enorme. Enorme por se centrar numa personagem já de si enorme, e enorme por ser capaz de encaixar em pouco mais de hora e meia tantas e tantas facetas diferentes - memória e presente, fantasmas e pessoas, (des)construção lírica e processo criativo, drama e documentário - de um dos artistas mais versáteis em actividade. 20 000 dias na Terra - qualquer coisa como 55 anos, menos uns trocos - é muita coisa. E Nick, que soube envelhecer, principalmente por não ter envelhecido, viveu-os a todos. Quem venham outros 20 000, e outros, e outros... From H[im] To Eternity.
«At the end of the 20th century, I ceased to be a human being.»
Realizador: Iain Forsyth, Jane Pollard
Argumento: Nick Cave, Iain Forsyth, Jane Pollard
Intérpretes: Nick Cave, Warren Ellis, Ray Winstone, Blixa Bargeld, Kylie Minogue, Susie Bick
Música: Nick Cave, Warren Ellis
Fotografia: Erik Wilson
Género: Documentário, Drama, Música
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Críticas
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Documentário
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Nick Cave
quinta-feira, 20 de novembro de 2014
Noah (2014)
NOAH, de Darren Aronofsky, é
um drama adaptado da narrativa da Bíblia referente à Arca de Noé mas com
algumas discrepâncias com a introdução de uma época feudal, incluindo até guerras
estilo fantasia.
A base da história não é muito diferente da que estamos habituados a ouvir. Noah,
(Russel Crowe) descendente de Adão, tenta sobreviver rodeado de homens marcados
pela corrupção e pecado que ameaçam a sua vida pacífica. Através dos seus
sonhos, prevê a iminente destruição da humanidade pelo Criador, através de um
dilúvio capaz de limpar o mal e castigar os pecadores. De forma a poupar os
inocentes, Noah é encarregado de construir uma arca capaz de suportar e
proteger os animais durante a chuva, para que eles se reproduzam no novo mundo.
Na tentativa de expressar a história por imagens, o esforço de revelar respostas a
problemas éticos poderiam impressionar se o desenrolar da acção não fosse tão
lento e enfadonho, de quase adormecer, perguntando quanto tempo falta para
acabar um filme de duas horas que mais parecem quatro. Podia ter alguém a
ler-me a história bíblica, que não ficaria mais aborrecido.
Tenho pena em notar que Russel Crowe continua a baixar os seus parâmetros em relação
à sua participação em filmes depois de protagonizações tão marcantes, com este desempenho
do elenco, em geral, presos a personagens com pouca evolução e formas de pensar
fechadas e contraditórias.
Quanto
aos efeitos especiais, há uma combinação do Criacionismo com Darwinismo para
explicar o início da Terra e o criador revela a sua existência através de
truques de magia, anjos caídos muito pouco realistas e nada impressionantes.
Verdade seja dita, esses truques milagrosos conseguem ser tão aborrecidas como
a acção.
Para quem não seja assim tão fácil de impressionar,
este filme é mais uma dor de cabeça
longa e dolorosa, e cerca de duas horas desperdiçadas.
Realizador: Darren Aronofsky
Argumento: Darren Aronofsky, Ari Handel
Intérpretes: Russell Crowe, Jennifer Connelly, Anthony Hopkins, Emma Watson, Logan Lerman
Música: Clint Mansell
Fotografia: Matthew Libatique
Género: Acção, Aventura, Drama
Duração: 138 minutos
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Acção
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Darren Aronofsky
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Drama
terça-feira, 18 de novembro de 2014
Maleficent (2014)
Cruel, impiedosa e vingativa. Quem se recorda do açucarado clássico da Disney The Sleeping Beauty, decerto se lembra também da torpe vilã, Malévola a fada malvada. Essa, que tão somente por lhe faltar um simples convite à celebração do nascimento de uma princesa, era capaz de semear o caos em todo um reino. Um modelo para os vilões que a sucederam, que acaba por se tornar o alicerce para a dualidade existencial entre o bem e o mal já vislumbrada por Tchaikovsky no seu segundo ballet.
Em 1959 chega-nos, pois, o colorido e encantador (mas, por vezes, assustador) desenho animado que se tornou um marco para a animação cinematográfica ao ser o mais dispendioso cartoon produzido pela Walt Disney Pictures até à data.
Cinco décadas depois estreia nas salas de cinema a mais recente adaptação em live-action desse mesmo clássico, MALEFICENT. Um verdadeiro passeio alegórico pela catarse nostálgica que era a Bela Adormecida.
Incluindo a participação de Angelina Jolie (cuja prestação é digna de louvor) no papel de protagonista, o filme conta a história que todos conhecemos ao revés adoptando uma inovadora perspectiva, a de Malévola. Lamentavelmente, aquilo que podia ter sido um passeio agradável por The Moors e redondezas converteu-se numa prova de 400 com barreiras, a qual em cada obstáculo parecia quebrar mais e mais a essência do conto de fadas.
Em primeiro lugar, sente-se o tempo marcadamente acelerado em Maleficent. Quase como se houvesse alguma pressa por parte de Robert Stromberg em projectar no pano a mixórdia de ideias que lhe passavam pela cabeça. Segundo, a metragem (a meu ver) sofre de incoerência em vários instantes, por exemplo, levando a cabo o âmago da questão: a dualidade bem vs mal/ amor vs ganância. Por que motivo a fada malvada, após ter sido atraiçoada pelo humano que amava (e já depois de ter lançado a maldição sobre Aurora), continuou a olhar pela princesa, inclusive salvando-a em algumas situações? Assuntos filosóficos à parte, note-se a inutilidade da construção da "barreira" de metal, a qual tanto trabalho deu àqueles pobres plebeus encarregues pelo rei, que se empenharam dia e noite, incessantemente! Tudo isto para chegar lá a nossa antagonista/protagonista e desviar-se com incrível facilidade dos espinhos de metal.
Ponto número três, as batalhas anti-climáticas...
Com o arsenal tecnológico ao dispor das grandes companhias de produção dos dias que correm, não creio que fosse pedir muito temperarem as poucas cenas de acção com uma pitada de épico. Mesmo num clássico da Disney. Infelizmente não é o caso, pelo menos não em Maleficent. Atrevo-me, mesmo, a dizer que o original de 1959 consegue reproduzir a batalha final de forma mais sublime.
Sem embargo, o filme não é imerecido de alguns feitos. Ele é visualmente deslumbrante, evocando mesmo certos elementos característicos de um James Cameron. Joga com as personagens do conto, de forma a inverter os papeis de herói e de vilão, procurando sempre introduzir o seu quê moralista no final que não a díade princepe/princesa. E acima de tudo, ele tenta. Tenta ser diferente da fórmula Disney que durante tanto tempo enfeitiçou o grande ecrã dando início, possivelmente, a uma nova fórmula mágica.
Perplexo perante esta nova adaptação daquele que considero ser o mais icónico dos títulos da era das princesas Disney, faço das palavras de Paulo Coelho as minhas: «Em cada instante das nossas vidas temos um pé nos contos de fadas e outro no abismo». Neste sentido, Maleficent aparenta estar na corda bamba, mas consegue equilibrar-se nos limites do plausível.
Realizador: Robert Stromberg
Argumento: Linda Woolverton (baseado no filme Sleeping Beauty)
Intérpretes: Angelina Jolie, Elle Fanning, Sharlto Copley
Música: James Newton Howard
Fotografia: Dean Semler
Género: Acção, Fantasia
Duração: 97 minutos
segunda-feira, 17 de novembro de 2014
Persepolis (2007)
De Marjane Satrapi só conheço, infelizmente, os filmes dirigidos a meias com Vincent Paronnaud. Não posso, pois, compará-los nem com as novelas gráficas que lhes serviram de base, nem com os seus trabalhos posteriores, a solo. Erro crasso, lacuna a suprir urgentemente, eu sei, amigo leitor. Posso, contudo, comparar PERSEPOLIS a Poulet aux prunes, a segunda obra da dupla, e a partir daí (tentar) tirar as minhas conclusões.
Escreva-se que, à primeira vista, a principal diferença entre os dois filmes reside na utilização da cor. A monocromia de Persepolis, com o negro muito acentuado, contrasta com a explosão colorida de Poulet aux prunes. Mais, o negro em Persepolis, de tão cerrado, parece oprimir frequentemente as suas personagens - recorde-se, a propósito, o inspirado plano que fecha o rosto de Marjane nos véus da polícia religiosa; o negro elimina e sobrepõe-se a (quase) tudo o resto. Em Poulet aux prunes não existem esses constrangimentos: é tudo mais aberto, mais feliz, mais despreocupado.
Outra das questões relevantes prende-se com o onirismo e a realidade presentes em ambos os trabalhos, e com o seu peso relativo. Persepolis e Poulet aux prunes constroem-se em torno das memórias familiares de Satrapi. Mas enquanto que no segundo essas recordações se erguem entre sonhos e fantasias, atingindo, a espaços, contornos Jeunetianos, no primeiro elas fundam-se, sobretudo, na realidade, mesmo quando, a certa altura, somos encarados por Deus (e Marx). Persepolis é, dessa maneira, um objecto muito mais denso do que o seu sucessor, talvez pela sua história ser, também ela, mais urgente e próxima à autora.
Mas é exactamente aí que o desconhecimento da obra individual quer de Satrapi, quer de Paronnaud, se faz sentir com maior intensidade: é-me impossível saber ao certo a contribuição de cada um deles para a equação final. Será que a presença de Satrapi se prende mais ao raconto, e a de Paronnaud ao lado estético? Será que Paronnaud limitou-se a ser a porta de entrada de Satrapi numa indústria desconhecida?
Seja como for - e, em última análise, essas interrogações são de somenos importância para o que aqui pretendemos -, Persepolis não tem medo de se assumir como a obra imensa que é. Marjane acaba uma estrangeira tanto no seu Irão como no Ocidente. Ali, pela liberdade que lhe roubam, asfixiando-a; aqui, por não se identificar com um estilo de vida para o qual não foi educada. Resistindo ao niilismo, resta-lhe apenas permanecer fiel à sua identidade cultural e às promessas feitas.
Será Persepolis o filme culturalmente mais relevante da última década? Ao misturar Arte e entretenimento, História e estória, Política e Religião, apelando, simultaneamente, a audiências ocidentais e iranianas, merece, pelo menos, alguma consideração nesse sentido. Por os regimes ainda se sucederem e as guerras continuarem a existir, urge (re)descobrir este monumento sociopolítico. E ouvir muito atentamente aquilo que Marjane tem para nos dizer.
[Persepolis é hoje exibido na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, às 21h00, integrado no QUÓRUM: Ciclo Cinema & Política. Oportunidade de ouro para ver, ou rever, uma das obras mais actuais do Cinema contemporâneo.]
Realizador: Marjane Satrapi, Vincent Paronnaud
Argumento: Marjane Satrapi, Vincent Paronnaud
Intérpretes: Chiara Mastroianni, Danielle Darrieux, Catherine Deneuve, Simon Abkarian, Gabrielle Lopes Benites
Música: Olivier Bernet
Género: Animação, Biografia, Drama
Duração: 96 minutos
domingo, 16 de novembro de 2014
Sunday Stills #52: "The Proposition"
Na semana em que um filme sobre Nick Cave chega às salas nacionais, o fotograma da semana pertence a uma das colaborações do músico/argumentista com John Hillcoat, THE PROPOSITION.
sábado, 15 de novembro de 2014
Dawn of the Planet of the Apes (2014)
DAWN OF THE PLANET OF THE APES, de Matt Reeves, sobressai pela sua clara superioridade em relação ao seu predecessor. Uma melhoria em quase todos os aspectos, fundamentalmente divertido e visualmente cativante, não desaponta nem impressiona.
Dez anos após a fuga de Caesar (Andy Serkis) e os restantes macacos em cativeiro, um vírus arrasou grande parte da população humana, os que restam vivem em comunidades segregadas. Os macacos, por sua vez, prosperam e vivem numa pequena cidade primitiva na floresta. Quando a necessidade de energia obriga os humanos a invadirem, inconscientemente, o território dos macacos, estes sentem-se ameaçados e sem razão nenhuma para confiar nos humanos. Num ambiente de grande tensão, onde o mínimo erro poderá desencadear uma guerra, tudo pode correr mal para qualquer um dos lados.
Dawn é simplesmente incrível, tal como Rise of the Planet of the Apes veio surpreender as massas com um filme que, literalmente, salvou um franchise morto, esta sequela promete-nos melhor para o que o futuro nos reserva, esperançosamente. Com desempenhos dignos por parte do elenco, visuais e efeitos especiais de cortar a respiração e o que considero ser o melhor trabalho de Reeves até à data. Infelizmente, o argumento não é o melhor. Tudo se perde, pouco chega realmente a ser coerente, e os problemas de continuidade, serão sempre, para mim, uma falha grave.
Definitivamente, um dos grandes filmes do ano. Apenas resta esperar que as futuras sequelas melhorem gradualmente, resolvam os problemas de argumento e um possível aumento de elenco... Talvez seja melhor não exagerar nas expectativas.
Realizador: Matt Reeves
Argumento: Mark Bomback, Rick Jaffa, Amanda Silver
Intérpretes: Andy Serkis, Jason Clarke, Gary Oldman, Keri Russell, Toby Kebbell, Kodi Smit-McPhee, Terry Notary
Música: Michael Giacchino
Fotografia: Michael Seresin
Género: Acção, Ficção-Científica
Duração: 130 minutos
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Ficção-Científica
The Deep (2012)
Contos de sobrevivência sempre me intrigaram - apelativos ao público maioritário, no entanto moralmente dúbios e fracos em conteúdo. Histórias verídicas, desde aventuras tresloucadas a simples acidentes de trabalho, deixam os seus protagonistas mundanos nas situações mais adversas, levando o(s) nosso(s) herói(s) a testar os seus próprios limites, tudo em prol da sobrevivência. THE DEEP, de Baltasar Kormákur, não foge à regra e apesar de se revelar uma verdadeira conquista cinematográfica, não desencadeia uma chama suficientemente forte para aquecer esta desventura gélida.
Seguimos, portanto, Gulli (Ólafur Darri Ólafsson), um simples pescador a quem o destino reserva dificuldades capazes de gelar os ossos. único sobrevivente dum naufrágio em alto mar no oceano atlântico, perto da costa sul da Islândia, Num ambiente onde o comum dos mortais vacila numa questão de poucos minutos, Gulli escapa graças a nada mais que um milagre e a sua boa camada de "gordura de foca", suficiente para suportar a baixa temperatura durante horas e uma planície de rocha vulcânica, descalço.
The Deep, ironicamente, não é tão profundo quanto ambiciona. Parece-me talento desperdiçado. actores surpreendentemente bons, um trabalho exemplar por parte de Baltasar Kormákur, deitado a perder por um enredo pouco envolvente. Talvez apenas 45 minutos bastassem, toda a inutilidade do aftermath acaba por pesar demais. Não que ver a vida miserável do pobre coitado (ainda pior depois de tudo) seja intolerável, apenas desnecessário e chato, para algo já inicialmente pouco cativante.
No fundo, é apenas mais uma tragédia individualista sem verdadeira paixão nem razão de ser. O facto que nada desta provação despolete qualquer tipo de resposta emocional da minha parte, é o suficiente para adormecer nos primeiros 5 minutos. Embora irrelevante, não me refiro apenas ao quão pouco sentido me fez, mas o quão pouco sentido fará para o restante público. Apenas uma questão resta - infortúnios aleatórios a pessoas aleatórias serão sempre inspiradoras?
Realizador: Baltasar Kormákur
Argumento: Jón Atli Jónasson, Baltasar Kormákur
Intérpretes: Ólafur Darri Ólafsson, Jóhann G. Jóhannsson, Stefán Hallur Stefánsson, Bjorn Thors, Þröstur Leó Gunnarsson
Música: Daniel Bjarnason, Ben Frost
Fotografia: Bergsteinn Björgúlfsson
Género: Drama
Duração: 95 minutos
sexta-feira, 14 de novembro de 2014
Rise of the Planet of the Apes (2011)
Realizado por Rupert Wyatt, surge em 2011 a prequela/reboot
(chamemos-lhe preboot) da saga do “Planeta dos Macacos”, mostrando como tudo
começou: RISE OF THE PLANET OF THE APES.
O enredo roda à volta de um símio não igual aos outros,
nascido de uma mãe cujo papel como cobaia num ensaio clínico para cura de Alzheimer
, acaba for lhe fornecer intelecto capaz de se aproximar ao de um humano. Salvo
em bebé por Will Rodman (James Franco) conseguimos ter acesso a todas as
vivências deste chimpanzé enquanto o vemos crescer como personagem e perceber
tudo aquilo que ele sente e a forma como reage ao que o rodeia. O nome do
chimpanzé é Caesar (acabando por ser irónico tendo em conta o seu papel de
líder tanto na fuga do abrigo como em toda a revolução primata) e embora seja
uma personagem CGI, Andy Serkis faz um excelente trabalho de motion capture,
como já nos habitou noutras performances, em dar vida e realismo ao movimentos
do macaco, e em fazer-nos criar empatia com a personagem. James Franco faz
também um bom trabalho como Will, aparecendo num papel um pouco desviado da sua
norma, mas também conseguindo fazer credível a relação de pai/ filho que tem
com Caesar, assim como toda a sua preocupação com o doença de seu pai e toda a sua luta em alcançar uma cura para o salvar.
Este filme tem também, a meu ver, uma das cenas mais “wow”
do ano em que saiu, vindo de uma das melhores personagens também desse ano: A
primeira vez que se ouve Caesar “falar” no abrigo de macacos, quando se
dirigindo a Dodge Lando (Tom Felton), daqueles momentos que quando vistos à
primeira vez é capaz de fazer cair o queixo, tendo em conta todo o contexto do
filme,
Vindo numa altura de
Hollywood em que ideias originais são difíceis de se encontrar, e este filme
sendo um preboot, como antes mencionei, acaba por fugir aos seus reles
companheiros cinematográficos que apenas têm intenção fazer dinheiro fácil, e
consegue-nos trazer um argumento sólido, com uma boa história, boa
representação, culminando num muito bom
filme.
Realizador: Rupert Wyatt
Argumento: Rick Jaffa, Amanda Silver
Intérpretes: Andy Serkis, James Franco, Christopher Gordon, Karin Konoval, Terry Notary, Freida Pinto
Música: Patrick Doyle,
Fotografia: Andrew Lesnie
Género: Acção, Ficção Cientifica
Duração: 105 minutos
Etiquetas:
Acção
,
Críticas
,
Ficção-Científica
quinta-feira, 13 de novembro de 2014
John Wick (2014)
Continuo a achar curioso quando alguém que habitualmente desempenha outras funções no Cinema decide dar o salto para a realização. Não se trata de nenhuma aversão prévia ou de qualquer outro tipo de preconceito, atenção; apenas gosto de tentar perceber o domínio da linguagem cinematográfica, nos seus diferentes aspectos, de quem transita de uma determinada tarefa para a outra. David Leitch e Chad Stahelski, que se estreiam na direcção com JOHN WICK, começaram como duplos.
Leitch e Stahelski deixaram de ser, pois, os homens à frente dos homens, mas atrás das câmaras, passando, simplesmente, a homens atrás das câmaras. A transição não foi, de todo, infeliz: John Wick, por ser o enorme bailado de pancadaria que é, permitiu-lhes a adaptação da dialéctica fílmica que já possuíam às suas novas atribuições. Nesse ponto, estamos conversados.
A grande surpresa surge, no entanto, quando nos apercebemos que os duplos convertidos em realizadores também não são nada incapazes na outra dança que ensaiam, a dos enquadramentos e planos. Não serão nenhuns virtuosos, é certo, mas conseguem tirar um par de coisas bastante interessantes da cartola. Nesse ponto, nota positiva, igualmente.
Há, em especial, um plano que justifica o encómio: Wick, interpretado por um Keanu Reeves inexpressivo quanto baste (não creio que haja outro), recebe uma auréola vermelha na discoteca que se prepara para transformar em matadouro. Banhado a luzes néonicas, o nosso hitman é santificado pela lente - e não terá o espectador, também ele, já santificado Wick quando lhe roubam o carro e matam o cão? - que espera o massacre. Wick é, assim, o santo pecador, a personificação do anjo da morte que precipita a sua fúria vingativa sobre aqueles que o privaram novamente da presença da mulher.
Expiar a morte pela matança (a impressão que me fica é que o filme se faz todo à volta do luto) parece tão absurdo como bombardear pela paz. Mas a cada ferida infligida, a cada bala disparada, a cada corpo que tomba, Wick aproxima-se da catarse. Tanto que, no final, já pode ir buscar outro cachorro.
Leitch e Stahelski exploram com um à-vontade raro em estreantes a dessensibilização da audiência face à violência com que é presenteada. No fundo, o que mais incomoda nem são as mortes gráficas a que Wick sujeita os mafiosos russos (os prevaricadores merecem o que os espera); é assistir ao corpo ferido do animal estendido junto ao do homem, à segunda morte da mulher de um homem que se move nos interstícios entre o Bem e o Mal, entre o sagrado e o profano - o monólogo de Michael Nyqvist sobre destinos amaldiçoados, a fazer lembrar o de Budd em Kill Bill, de Quentin Tarantino, deixa, de resto, bem clara essa ideia. Quem dança com o Diabo - perdão, com o Santo Diabo -, arrisca-se a perder a alma.
Título Original: John Wick (Canadá/China/EUA, 2014)
Realizador: David Leitch, Chad Stahelski
Argumento: Derek Kolstad
Intérpretes: Keanu Reeves, Michael Nyqvist, Alfie Allen, Willem Dafoe, Adrianne Palicki, Ian McShane
Música: Tyler Bates, Joel J. Richard
Fotografia: Jonathan Sela
Género: Acção, Crime, Thriller
quarta-feira, 12 de novembro de 2014
The Wolf of Wall Street (2013)
THE WOLF OF WALL STREET (2013),
baseado numa “história verídica”, é uma comédia premiada realizada por um
grande realizador da actualidade, Martin Scorsese, e nomeada para cinco Óscares
da Academia.
A acção do filme desenrola-se em
redor de Jordan Belfort (Leonardo DiCaprio), um ambicioso corretor de bolsa que
após a sua empresa falir, por consequência da “Black Monday”, encontra a
possibilidade de ganhar dinheiro por comissão em acções de baixo valor usando as
suas técnicas de venda agressivas e persuasivas. Ao aperceber-se da facilidade
com que podia explorar o dinheiro das suas vítimas, devido ao facto de estas
estarem viciadas, Jordan entra no Mundo dos milionários onde tudo tem um preço
e usufrui dos prazeres dessa vida: materialismo; festa; sexo e muita, muita
droga. Sem se aperceber, vicia-se na droga mais potente de todas, o dinheiro, e
abraça a sua ganância pois mesmo as pessoas que o julgariam como antiético e
destructivo teriam dificuldades em afirmar que o crime não compensa.
Como pontos negativos a este
filme tenho apenas a apontar os longos 180 minutos e a falta de desenvolvimento
das personagens, ao longo dos anos que o filme retrata, pouco ou nada mudou a
forma de pensar e agir de todas as personagens, talvez nunca tenhamos de mudar
quando podemos comprar tudo que nos venha à cabeça.
Trata-se de uma comédia que conta
com brilhantes actuações dignas da nomeação para os Óscares de actor principal
e secundário, destacando-se a performance
emotiva e irrepreensível de Leonardo DiCaprio que é sem dúvida um dos principais
responsáveis pela qualidade do filme.
Apesar de haver alguma disputa entre os críticos sobre filme por falta de aprovação das acções de Jordan, em quem esta biografia é baseada, considero-o bom para se ver em casa, quando precisarem de soltar umas boas gargalhadas com algumas das cenas mais hilariantes de 2013.
Apesar de haver alguma disputa entre os críticos sobre filme por falta de aprovação das acções de Jordan, em quem esta biografia é baseada, considero-o bom para se ver em casa, quando precisarem de soltar umas boas gargalhadas com algumas das cenas mais hilariantes de 2013.
Realizador: Martin Scorsese
Argumento: Terence Winter
Intérpretes: Leonardo DiCaprio, Jonah Hill, Margot Robbie, Mathew McConaughey, Kyle Chandler, Rob Reiner, Jon Bernthal
Fotografia: Rodrigo Prieto
Género: Biografia, Comédia
Duração: 180 minutos
Etiquetas:
Biografia
,
Comédia
,
Crime
,
Críticas
,
Martin Scorsese
terça-feira, 11 de novembro de 2014
Lucy (2014)
A mesma mente que nos apresentou Léon, Taken e The Fifth Element (entre outras obras) brinda-nos com LUCY, o mais recente trabalho escrito e realizado por Luc Besson, com toda a idiossincrasia que seria de esperar do cineasta francês. Uma mente que, certamente, neste filme se faz transbordar de ideias, conceitos e constructos lamentavelmente mal executados e fugazes das palmas do corpo que a contém. Afinal, já Ícaro demonstrara em tempos de outrora o que acontece a um homem que voa demasiado perto do sol.
Confesso que após assistir ao trailer não fiquei com grandes expectativas, o que talvez tenha valido a favor do filme, visto que não o achei por de mais tão terrível quanto tanta gente o fazia parecer. Está bem, é certo que este dá um grande pontapé na realidade ao trazer à baila a história dos 10% do potencial cognitivo humano, ou da "capacidade cerebral", parafraseando a película (note-se que há muito se sabe que isto não passa de um mito). Como se isso não bastasse, a heroína, Lucy, ganha uma imensidão de poderes tremendamente absurdos que vão para além de toda compreensão suportável ao pensamento humano.
[Mas, ei!, não vamos nós esquecer-nos que isto se trata de um filme de ficção-científica. Tudo é possível, segundo a lógica do realizador.]
É claro que as coisas acontecem por uma razão. Aparentemente, se ingerirmos uma quantidade enorme o suficiente de droga temos a possibilidade de passar férias ao período mesozóico. Pelo menos foi o que se passou com a nossa protagonista quando adquiriu o poder de manipular o espaço-tempo a seu bel-prazer (e que belo exemplo a transmitir a uma plateia que incuba milhões de adolescentes) . Mas isso são outros quinhentos.
Se pusermos de lado o carácter pretensioso do filme e em vez disso o virmos mais como uma tentativa de Besson em produzir uma epígrafe de super heróis, este torna-se bastante mais tragável.
A sequência inicial tem como intuito dar a entender a premissa do filme. Ela mostra-nos um hominídeo Australopiteco (o qual presumo representar os primórdios da espécie humana), seguindo-se uma curta narrativa de Scarlett Johansson: «A vida foi-nos dada à mil milhões de anos. E o que fizemos nós com ela?».
A transição para o plano seguinte leva-nos ao Taipei dos tempos modernos. Lá contamos, com a charmosa Scarlett numa galante actuação enquanto Lucy - uma jovem americana - que estava à porta de um hotel com o homem com quem dizia namorar há uma semana. O sujeito tinha como missão entregar uma mala a um tal Jang que se encontrava nesse mesmo hotel. Relutante em completar a tarefa, ele procura convencer Lucy a tomar o seu lugar. Acaba por conseguir quando finalmente a algema à mala, afirmando que só Jang possuía a chave. Posto isto, Lucy vê-se envolvida numa rede de tráfico de droga que, por sua vez, faz dela uma mula de contrabando. Os malfeitores colocam nas entranhas de Lucy e de mais 3 "mulas" sacos detentores de uma nova droga que ia circular as ruas. Para azar o deles, um dos capangas (não o mais inteligente decerto) decide, porventura, dar uma tareia à nossa personagem principal libertando a droga no seu organismo e despoletando todo o enredo que se segue.
A história de Lucy é intercalada com cenas de palestras, cujo orador é a nossa personagem secundária, o professor Norman - aqui interpretado por Morgan Freeman, não fosse o filme perder toda a sua credibilidade -, com um propósito elucidativo para o espectador. Isto é, elas vão servir para nos contextualizar em termos conceituais dando-nos uma ideia (embora errada) da hipótese subjacente por detrás da premissa.
O filme vai, deste modo, escalando numa panóplia de situações enquanto Lucy procura um propósito para a sua nova forma de existência à medida que a sua capacidade cerebral aumenta em pontos percentuais.
Desde a aquisição dos infames super-poderes, até perseguições de carros em alta velocidade pelas ruas de Paris. De dilemas morais, até confrontos armados entre gangsters coreanos e policias franceses. Até mesmo com alguma pornografia animal à mistura (prometo que não estou a inventar nada disto), Este é um título que, seguramente, será diferente de tudo o que já viram este ano, para o melhor ou para o pior e que, quanto muito, vos dará alguns objectos de reflexão. Eu, por exemplo, acho reconfortante a ideia de que, aquando do alcance do ápex da dita capacidade cerebral, a espécie humana evoluirá para uma pen drive.
Título Original: Lucy (França, 2014)
Realizador: Luc Besson
Argumento: Luc Besson
Intérpretes: Scarlett Johansson, Morgan Freeman, Min-sik Choi, Amr WakedPilou Asbæk, Analeigh Tipton
Música: Eric Serra
Fotografia: Thierry Arbogast
Género: Acção, Ficção-Científica, Thriller
Duração: 89 minutos
Etiquetas:
Acção
,
Críticas
,
Ficção-Científica
,
Thriller
domingo, 9 de novembro de 2014
Only Lovers Left Alive (2013)
À primeira cena de ONLY LOVERS LEFT ALIVE fica logo muito claro aquilo a que se está prestes a assistir: as estrelas rodopiam, Tilda Swinton rodopia, Tom Hiddleston rodopia, um disco rodopia, com a câmara a aproximar-se a cada corte, num picado (quase) absoluto, fechando nos rostos das personagens que despertam. Estamos perante almas-gémeas separadas, dois seres empurrados para diferentes cantos do globo, mas que, ainda assim, conseguem sentir a presença um do outros.
O movimento inicial repetir-se-á mais à frente no filme, quando os dois amantes estiverem já reunidos. Quem sabe, o movimento inicial poderá, também ele, ser uma repetição de um outro anterior. Mas nada disso parece importar. Adam e Eve (tão bíblico) estão, de novo, juntos. Ela, muito alva; ele, muito negro. Imortais numa cidade morta - toda a gente parece ter fugido de Detroit -, deambulam pelas ruas à noite, sem fim programado.
Quatro coisas saltam à vista neste Only Lovers Left Alive: 1) a magnífica fotografia de Yorick Le Saux, entre a nitidez dos pretos e brancos e a fluorescência dos néons destingidos; 2) o gosto pelo antigo dos vampiros de Jim Jarmusch, demonstrado na escolha dos carros, das roupas, da música e dos objectos com que se rodeiam; 3) a ideia de que o Cinema de Jarmusch se continua a fazer mais pela viagem do que pelo destino propriamente dito; e 4) a importância que se atribui ao toque (e ao analógico) num mundo cada vez mais digital.
Assim, nestes vampiros perdidos algures entre o patetismo dos de Neil Jordan e o vício dos de Abel Ferrara, encontramos a ironia da questão: quem já viveu demasiadas vidas conta o tempo com um interesse maior do que quem só viveu uma. Daí se explica o culto por tudo o que é vintage, pelo antiquado, pelo descontinuado. Quando já nem o sangue (ou a água, como às tantas se diz) é puro, será que ainda vale a pena existir?
No final, é a câmara que desmente o próprio título. Os vampiros, já sem nada, precipitam-se sobre um casal de namorados. Corte para preto. Se nem os amantes sobrevivem nesta impureza, que razão sobrará para que se continue a Amar?
[Only Lovers Left Alive, de Jim Jarmusch, é exibido hoje pelo Cineclube de Vila do Conde no Teatro Municipal de Vila do Conde, às 21h45.]
[Only Lovers Left Alive, de Jim Jarmusch, é exibido hoje pelo Cineclube de Vila do Conde no Teatro Municipal de Vila do Conde, às 21h45.]
Título Original: Only Lovers Left Alive (Alemanha/Grécia/Reino Unido, 2013)
Realizador: Jim Jarmusch
Argumento: Jim Jarmusch
Intérpretes: Tilda Swinton, Tom Hiddleston, Anton Yelchin, Mia Wasikowska, John Hurt, Jeffrey Wright
Música: SQÜRL, Jozef van Wissem
Fotografia: Yorick Le Saux
Género: Drama, Romance, Terror
Etiquetas:
Críticas
,
Drama
,
Jim Jarmusch
,
Romance
,
Terror
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