domingo, 9 de novembro de 2014

Only Lovers Left Alive (2013)

À primeira cena de ONLY LOVERS LEFT ALIVE fica logo muito claro aquilo a que se está prestes a assistir: as estrelas rodopiam, Tilda Swinton rodopia, Tom Hiddleston rodopia, um disco rodopia, com a câmara a aproximar-se a cada corte, num picado (quase) absoluto, fechando nos rostos das personagens que despertam. Estamos perante almas-gémeas separadas, dois seres empurrados para diferentes cantos do globo, mas que, ainda assim, conseguem sentir a presença um do outros.


O movimento inicial repetir-se-á mais à frente no filme, quando os dois amantes estiverem já reunidos. Quem sabe, o movimento inicial poderá, também ele, ser uma repetição de um outro anterior. Mas nada disso parece importar. Adam e Eve (tão bíblico) estão, de novo, juntos. Ela, muito alva; ele, muito negro. Imortais numa cidade morta - toda a gente parece ter fugido de Detroit -, deambulam pelas ruas à noite, sem fim programado.

Quatro coisas saltam à vista neste Only Lovers Left Alive: 1) a magnífica fotografia de Yorick Le Saux, entre a nitidez dos pretos e brancos e a fluorescência dos néons destingidos; 2) o gosto pelo antigo dos vampiros de Jim Jarmusch, demonstrado na escolha dos carros, das roupas, da música e dos objectos com que se rodeiam; 3) a ideia de que o Cinema de Jarmusch se continua a fazer mais pela viagem do que pelo destino propriamente dito; e 4) a importância que se atribui ao toque (e ao analógico) num mundo cada vez mais digital.

Assim, nestes vampiros perdidos algures entre o patetismo dos de Neil Jordan e o vício dos de Abel Ferrara, encontramos a ironia da questão: quem já viveu demasiadas vidas conta o tempo com um interesse maior do que quem só viveu uma. Daí se explica o culto por tudo o que é vintage, pelo antiquado, pelo descontinuado. Quando já nem o sangue (ou a água, como às tantas se diz) é puro, será que ainda vale a pena existir?

 No final, é a câmara que desmente o próprio título. Os vampiros, já sem nada, precipitam-se sobre um casal de namorados. Corte para preto. Se nem os amantes sobrevivem nesta impureza, que razão sobrará para que se continue a Amar?

[Only Lovers Left Alive, de Jim Jarmusch, é exibido hoje pelo Cineclube de Vila do Conde no Teatro Municipal de Vila do Conde, às 21h45.]


Título Original: Only Lovers Left Alive (Alemanha/Grécia/Reino Unido, 2013)
Realizador: Jim Jarmusch
Argumento: Jim Jarmusch
Intérpretes: Tilda Swinton, Tom Hiddleston, Anton Yelchin, Mia Wasikowska, John Hurt, Jeffrey Wright
Música: SQÜRL, Jozef van Wissem
Fotografia: Yorick Le Saux
Género: Drama, Romance, Terror
Duração: 123 minutos


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