domingo, 30 de novembro de 2014

Boyhood (2014)

Depois de ver BOYHOOD sinto-me completamente esmagado perante a brutalidade com que a pelicula encara  a realidade. Não se trata apenas de mais um coming-of-age. O que vemos são dinâmicas de um quotidiano que, de tão mundano, tão comum, tão vulgar e ao mesmo tempo tão único, se torna, ele mesmo, um buraco negro capaz de sugar o espectador para o próprio ambiente fictício que cria  no invólucro da existência (também  ele, diga-se de passagem, incrivelmente rico, natural e verdadeiro).


O filme é simplesmente avassalador. Avassalador pela  maneira como retrata a vida, e avassalador pela forma como o faz.

Não há intermitências no plano temporal de Boyhood- porque também não as há na vida. O tempo avança implacavel e impiedosamente traçando, em duas horas e meia, o desenvolvimento de  Mason (Ellar Coltrane) de um modo longitudinal. 

Contando com actuações absolutamente excepcionais, a narrativa, linear e coesa, expressa harmonia na proporção de drama, comédia, sentimentos e emoções. O argumento é fluído, não existe um sem-sentido nas falas dos indivíduos que não se encaixe perfeitamente naquilo que é a norma em qualquer discurso. Os planos, simplistas e centralizados, são desprovidos de uma necessidade de grandeza, limitando-se a projectar acontecimentos no ponto de vista de alguém que os esteja a ver de fora- e no entanto, é tão fácil para nós (esse alguém que está de fora) identificar-mo-nos com as personagens. Quer sejamos uma criança de 7 anos que se despede com nostálgica tristeza da cidade onde vive, quer sejamos um miúdo de 13 anos que se tenta inserir numa nova escola. Um pai ausente, que procura restabelecer laços afectivos com os filhos, ou uma mãe que tenta desesperadamente conciliar um trabalho precário com a educação dos mesmos. Não importa quem. Não interessam as circunstâncias. Boyhood é a história de uma vida: a minha, a sua, ou a do seu vizinho. 

Richard Linklater ousa deliciar-nos com 12 anos de vivências sem flashbacks, grandes adornos ou efeitos especiais. Uma década (e mais uns trocos) do progresso das personagens, não só enquanto elementos figurativos extrapolados da criatividade de uma mente brilhante (que é a de Linklater), mas também das personagens enquanto actores, representações reais do mundo objectivo. 

Estamos, portanto, na presença de uma obra de arte sem igual, uma experiência cinematográfica como nunca antes vista e que, seguramente, não o será outra vez tão cedo.


Título Original: Boyhood (EUA, 2014)
Realizador: Richard Linklater
Argumento: Richard Linklater
Intérpretes: Ellar Coltrane, Patricia Arquette, Ethan Hawke, Lorelei Linklater, Marco Perella
Fotografia: Lee Daniel, Shane F. Kelly
Género: Drama
Duração: 165 minutos



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