sábado, 17 de novembro de 2012

Lawless (2012)

A Lei Seca foi responsável pelo aparecimento de uma nova categoria de heróis românticos no folclore norte-americano. Materialização do "Sonho Americano", a figura do gangster de metralhadora na mão, enriquecido pela crise, rivalizava com a do pioneiro que reclamava a terra aos índios. A Lei Seca terá sido, desse modo, um novo Velho Oeste, não se estranhando, portanto, que se chame a LAWLESS - e ao muito mais poético título português DOS HOMENS SEM LEI - um neo-western. Aliás, e considerando o rótulo, quiçá pretensioso e elitista, mas ainda assim útil, há algo na imagem dos irmãos Bondurant que puxa tanto a Dillinger como aos pistoleiros do faroeste, genericamente representados sob a égide sem nome de Clint Eastwood. É certo que lhes falta o charme e o carisma bruto de ambos os arquétipos, mas compensam na vontade de não se vergarem perante ninguém. No caso dos Bondurant - que não sendo mafiosos (são apenas contrabandistas de álcool), seguem o seu apanágio - a contenda é com a Lei, na figura de um agente especial entre o sádico e o psicótico.

John Hillcoat nunca se esquivou a mostrar violência ao público; será essa a sua principal característica autoral. Em Lawless a agressão toma por vezes contornos exagerados sem que, no entanto, obrigue a audiência a desviar o olhar (como no caso de The Road, onde Viggo Mortensen encontrava caves de gado canibal desmembrado). Os Bondurant - e há-os para todos os gostos, o bêbedo, o cobardolas e o invencível -  evitam, contudo, utilizar a força como recurso. A dinâmica entre os irmãos é espantosa: Forrest e Howard, os mais velhos, quase não falam entre si, comunicando maioritariamente por grunhidos e olhares ressentidos; Jack, o mais novo, começa o filme afastado dos irmãos - é um yes man, privado dos «acontecimentos terríveis» que fizeram dos outros dois aquilo que são - mas acaba convertido num anjo da morte, pronto a precipitar a sua fúria sobre quem matou o seu amigo. Convergem os três para o mesmo ponto, o da violência sem escolha, e nem as mulheres os conseguem salvar - Jessica Chastain para Tom Hardy e Mia Wasikowska para Shia LaBeouf.

Extraordinariamente filmado, com especial mérito para a direcção artística de Gershon Ginsburg - não haverá quem ponha em causa de que se trata de um belo filme de época, detalhadamente recriado -, e de fotografia, Lawless falha, sobretudo, a nível de história. Há qualquer coisa no desenvolvimento que deixa algo a desejar e Hillcoat falha em solidificar o filme. O argumento de Nick Cave, que já havia colaborado com o realizador em Ghosts... of the Civil Dead e The Proposition, constitui, no entanto, um bom esforço, do qual resulta uma boa fita de crime. É engraçado como dois australianos decidiram recriar dois dos géneros mais emblemáticos do Cinema norte-americano, o western e o filme de gangsters, ao jeito bluegrass, ajudado pela banda sonora de Cave e Warren Ellis. A nota com que termina revela, de resto, o espírito do filme: podemos até ser imortais, mas a Morte não leva ninguém com vida.


Título Original: Lawless (EUA, 2012)
Realizador: John Hillcoat
Argumento: Nick Cave (baseado no livro de Matt Bondurant)
Intérpretes: Shia LaBeouf, Tom Hardy, Jason Clarke, Guy Pearce, Jessica Chastain, Mia Wasikowska, Dane DeHaan, Gary Oldman
Música: Nick Cave, Warren Ellis
Fotografia: Benoît Delhomme
Género: Crime, Drama
Duração: 116 minutos


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